Na Mídia - CASO MÉDICO
O Globo / Rio
05/11/2018
Cremerj vai investigar morte de pacientes durante transferência
O Conselho Regional de Medicina do
Rio (Cremerj) vai investigar a causa das mortes de quatro pacientes, em
estado grave, que foram transferidos, no sábado, do Hospital Lourenço Jorge, na
Barra, para outras unidades. Eles estavam internados na Coordenadoria de
Emergência Regional (CER), que funcionava no segundo andar do complexo
hospitalar e foi destruída por um incêndio de causas ainda desconhecidas.
Ontem, a prefeitura, que havia divulgado no sábado apenas três óbitos, informou
que um quarto paciente também morreu após ser transferido para outro hospital,
o que aumentou o número de vítimas. Uma delas foi uma idosa de 83 anos que se
recuperava de um AVC.
O prefeito Marcelo Crivella anunciou que a CER será
reaberta esta semana. Ao deixar ontem o Lourenço Jorge, ele admitiu que os
hospitais da prefeitura não têm equipamentos de combate a incêndio, como
sprinklers. Segundo ele, a unidade da Barra não contava sequer com uma brigada
de incêndio.
— Em se tratando de hospitais, a gente sempre priorizou o
atendimento de emergência e empurrava as precauções para a frente. No passado,
a legislação não previa que as unidades tivessem equipamentos, como sprinklers
— disse, lamentando a falta de uma brigada de incêndio. — Se tivéssemos aqui um
grupo, tenho certeza que o prejuízo seria menor.
No sábado, logo após o incêndio, o coordenador de Captação
de Recursos da prefeitura, Victor Travancas, afirmou que havia solicitado
recursos de emendas parlamentares à bancada de deputados federais do Rio para
resolver o problema que se arrasta desde 2003, mas não foi atendido. Segundo
ele, os parlamentares preferiram destinar verbas a estradas do interior. Após
dar a declaração, Travancas pediu demissão.
Irritado com a acusação, o presidente da Câmara dos
Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), lembrou ontem que, em 2017, foram liberados
R$ 50 milhões de verbas parlamentares para a prefeitura do Rio:
— Tenho certeza que o prefeito sabe do empenho da bancada e
não concorda com a tese do assessor.
No momento do incêndio, servidores estimaram que cerca de
300 pessoas estavam no CER. Representantes do Cremerj, que estiveram no hospital, afirmaram que vão verificar se
houve falhas nos protocolos adotados para a transferência de pacientes. Eles
explicaram que o conjunto de regras varia de acordo com o estado de saúde de
cada paciente.
Vamos apurar os óbitos, saber se, no momento das
transferências, o hospital contava com material e especialistas necessários —
disse a diretora do Cremerj,
Rafaella Leal.
—
SAÚDE DE PACIENTE AGRAVOU
Com relação às causas do incêndio, a prefeitura não
descarta a hipótese de que tenha sido criminoso. A suspeita é porque, no mesmo
pavimento onde ficava o CER, também funcionavam áreas administrativas e
laboratórios que não abrem nos fins de semana. O município também vai checar
possíveis oscilações de energia junto à Light, já que foram relatados picos de
luz no sábado. E, por último, pediu uma perícia complementar ao Instituto de
Criminalística Carlos Éboli. A Polícia Civil informou que agentes da 16ª DP
(Barra) já vistoriaram o local.
Ontem, quando não havia sinais de superlotação na unidade,
o dia foi de muito trabalho. Funcionários da Comlurb limpavam o local,
retirando objetos destruídos pelas chamas, como pedaços de metal retorcidos, e
até mesmo caixas de medicamentos inutilizados. Por volta das 9h30m, os serviços
chegaram a ser suspensos porque surgiu um novo foco de incêndio, rapidamente
controlado.
Dentro do hospital, parentes de pacientes mostravam
preocupação. A aposentada Elenir Lima, de 54 anos, diz que que o marido
Sebastião Lima, de 76, que estava internado com a glicose alta, foi levado para
o Lourenço Jorge (no mesmo complexo do CER). Ela disse que o quadro de saúde de
Sebastião se agravou.
—Ele estava na sala amarela do CER e agora foi para a
vermelha. Os médicos explicaram que foi por causa da quantidade grande de
fumaça inalada —criticou Elenir.
Cerca de 70 pacientes foram transferidos para 14 unidades
de saúde municipais e federais, até a manhã de ontem. Mas, segundo o Cremerj há ainda de 20 a 30
pacientes internados no CER à espera de vagas em outros hospitais.
Reportagem do GLOBO, publicada em maio de 2016, mostrou que
de 42 hospitais públicos do Rio, 41 não tinham certificado do Corpo de
Bombeiros. Das 29 unidades do município, a única exceção era o Hospital Evandro
Freire (Ilha do Governador). O CER Barra é a segunda unidade de grande porte da
prefeitura a pegar fogo. Em 2016, um incêndio também atingiu o Hospital Pedro
II (Santa Cruz).
Após o incêndio no Museu Nacional, o próprio Crivella
enviou à Câmara de Vereadores projeto de lei que obriga estabelecimentos
públicos e privados com grande circulação de público, que guardem bens
históricos, a ter brigada de incêndio 24 horas. A expectativa é que o
Legislativo vote o projeto esta semana.
“Se tivéssemos aqui um grupo, tenho certeza que o prejuízo
seria menor.” Marcelo Crivella, prefeito
“Ele estava na sala amarela e foi para a vermelha porque
inalou muita fumaça” Elenir Lima, mulher de paciente
Perguntas sem respostas
Quais
circunstâncias levaram aos quatro óbitos de pacientes durante as transferências?
O GLOBO perguntou o que ocasionou os quatro óbitos durante
a transferência de pacientes da Coordenação de Emergência Regional (CER), que
funcionava no segundo andar do Hospital Lourenço Jorge, na Barra, e foi
informado que só o Instituto MédicoLegal poderá esclarecer a causa das mortes.
O jornal quis saber ainda quando a quarta vítima morreu, mas não foi informado.
Quantos
casos foram agravados por conta do incêndio?
O jornal solicitou posicionamento da Secretaria municipal
de Saúde sobre o caso de Sebastião Gonçalves Lima, de 76 anos, que, segundo
relato da família, teria tido seu quadro de saúde agravado depois de inalar
muita fumaça. Perguntou ainda se o mesmo aconteceu com outros pacientes, mas o
órgão não deu a informação.
Para
quais hospitais os pacientes foram transferidos?
Cerca de 70 pacientes tiveram que ser transferidos do CER,
mas a prefeitura não disse para quais unidades. No sábado, logo após o
incêndio, alguns pacientes tinham sido levados para o próprio Hospital Lourenço
Jorge e para o Albert Schweiter, em Realengo. Mas a lista com todas as
transferências não foi divulgada.
A
prefeitura não explicou por que os hospitais não dispõem de equipamentos de
combate a incêndio.
A informação foi dada pelo coordenador de Captação de
Recursos da prefeitura, Victor Travancas, que ontem pediu demissão.