Clipping - Sem remédio em meio ao caos
O Globo / Rio
16/11/2017
Clínicas da família estão com equipes reduzidas
Enquanto autoridades apertam cada vez mais o caixa da saúde, os pacientes são obrigados a enfrentar uma rede municipal depauperada. Com esquizofrenia, a dona de casa Onilda Souza Bello, de 52 anos, precisou comprar pelo segundo mês consecutivo o medicamento para controlar a sua doença. Ela esteve ontem novamente na Clínica da Família Marcos Valadão, em Acari, perto de onde mora, e não encontrou o remédio. Além da despesa que não estava prevista no seu orçamento, ela teme pelo futuro da unidade:
— O remédio custa R$ 12,90. Parece pouco, mas já é o
segundo mês que preciso comprar. Com o tempo, esse dinheiro faz falta. Estou
muito triste. Tenho medo de que a clínica acabe.
A enfermeira Janete Fabiana da Silva também deixou a
clínica sem o medicamento. Diagnosticada com sarna, ela calcula que o
tratamento custará R$ 60. Ela acabou se juntando a um grupo de 50 funcionários
da unidade que, sem previsão de receber salário e vale-transporte, fez uma
caminhada ontem pela Avenida Pastor Martin Luther King Junior, em Acari, contra
as péssimas condições da saúde pública.
A Marcos Valadão, que fica numa das áreas mais pobres da cidade, não está fazendo nem mesmo exames de sangue, porque o contrato com o laboratório terminou. Dos 171 insumos da lista de medicamentos da rede básica, a clínica só recebeu 40 para este mês, segundo funcionários. Até papel para as receitas está em falta.
— Eu fui liberada da
maternidade Maria Amélia. Trabalho lá com crianças! Estou cheia de coceira.
Como vou trabalhar assim? Os médicos, mesmo sem salário, estão atendendo, mas
não tem remédio — contou Janete.
A unidade em Acari está funcionando apenas com 30% de suas
equipes por causa dos atrasos nos salários. A situação é a mesma nas 117
clínicas da família, todas administradas por organizações sociais (OSs). Na
Rocinha, o drama dos pacientes que procuram a Clínica da Família Maria do
Socorro Silva e Souza é o mesmo.
— Estou com dor no estômago há dois dias, tomando Buscopan.
Eles me avisaram que só estão atendendo os casos de emergência. Vou ter que ir
para a emergência do Hospital Miguel Couto, mesmo sendo mais longe da minha
casa — lamentou a dona de casa Antônia Fernandes, de 52 anos, após duas horas
de espera.
Na Rocinha, estão disponíveis apenas 25% dos medicamentos,
estimam funcionários da farmácia. Faltavam ontem, por exemplo, o antibiótico
Amoxilina e Dipirona.
— Só me disseram que os remédios estão em falta. Eu tomo seis medicamentos, mas três, para o controle da hipertensão, não consegui pegar — disse Benedito Barbosa de Souza, de 70 anos.