Clipping - Faperj recebeu apenas 9,5% do orçamento previsto para 2017
O Globo /
27/06/2017
Em meio à crise econômica fluminense, a Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) recebeu, até agora, apenas 9,5%
do orçamento aprovado para este ano. Dos R$ 537,01 milhões que seriam destinados
ao órgão, foram pagos até o momento somente R$ 51,08 milhões. A receita foi
complementada por R$ 34,81 milhões referentes à verba bloqueada no ano passado.
Augusto Raupp, presidente da fundação, admite a dificuldade
para honrar os financiamentos aprovados. Na edição de ontem, O GLOBO revelou
que um grupo de cientistas da UFRJ precisará devolver R$ 570 mil que seriam
aplicados em pesquisas sobre o mosquito Aedes aegypti, vetor de doenças como
dengue, zika e chicungunha, devido à morte do líder da equipe, o bioquímico
Mário Alberto Cardoso da Silva Neto.
— Temos muito interesse na continuação desse projeto,
porque, mesmo sem recursos, conseguiu resultados rápidos sobre um tema
prioritário — enfatiza Raupp. — Mas o termo de outorga, que estabelece a administração
da verba, é intransferível. Tudo é feito com base em uma pessoa física, que, se
não cumprir seus compromissos, será questionada no tribunal de contas. Por
isso, precisava ser o Mário. Talvez seja necessário criar regras para
possibilitar a eleição de novos coordenadores para os programas.
Segundo Raupp, os cofres vazios da Faperj podem obrigar os
laboratórios a viver apenas das bolsas que vão direto para os pesquisadores.
Não há dinheiro para ser encaminhado aos projetos.
Desde 2015, não conseguimos pagar um tostão para pesquisas.
Para isso mudar, será necessário que estado e governo federal firmem um regime
de recuperação fiscal.
—
DEBANDADA DE ESTUDANTES
Chefe do Laboratório de
Hanseníase da Fiocruz, Milton Moraes tem projetos aprovados que não foram
contemplados, e outros cujo financiamento foi transferido pela Faperj para uma
agência federal, o CNPq. O cientista também conta com acordos internacionais
para conduzir os seus estudos.
— Vivemos uma crise, mas temos um problema maior, que é o
atual modelo de financiamento da pesquisa científica — ressalta. — Muitos
estudantes estão desmotivados porque o valor das bolsas de estudo não é
reajustado há muito tempo. Um doutorando, por exemplo, recebe menos de R$ 3
mil. Então, depois de tantos anos de dedicação, eles preferem abandonar sua
carreira ou buscam emprego no exterior. As instituições estrangeiras conseguem
uma mão de obra extremamente qualificada sem praticamente nenhum investimento.
Stevens Rehen, neurocientista da UFRJ e do Instituto D’Or
de Pesquisa e Ensino, tem quatro projetos cujo financiamento foi aprovado pela
Faperj, embora ainda não tenham sido pagos.
—É o equivalente a R$ 1,2 milhão, e não vou ver esse
dinheiro — revela Rehen, que também comenta a retirada de verbas dos
pesquisadores da UFRJ que estudam o mosquito da dengue. — Deveria haver algum
mecanismo para identificar a viabilidade da continuação do projeto. Se não
existe, é por uma questão de burocracia.
Segundo Rehen, a estiagem recente inibiu a presença do
Aedes aegypti, mas o mosquito voltará em breve, trazendo novamente enfermidades
que assolarão o estado do Rio.
— Sem investimentos em pesquisa, não saberemos como lidar
com situações emergenciais, como epidemias causadas por um vírus ou pelo
aquecimento global — diz. — Em estudos anteriores, que foram financiados pela
Faperj, conseguimos destrinchar a relação entre a zika e a microcefalia e
propusemos a utilização de dois medicamentos. Agora, no entanto, estamos indo
para a contramão, e a ciência está cada vez mais invisível. Existe a
possibilidade de que, a longo prazo, a zika provoque alteração no genoma das
células, o que levaria a uma propensão maior a doenças mentais. Mas não
poderemos analisar essa hipótese, porque precisamos de investimento da Faperj.