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PARECER CREMERJ Nº 60/1997

INTERESSADO: Cons.  A. N. P. A.
Diretoria do CREMERJ

RELATOR: Dr. Paulo Sérgio da Costa Martins
Assessoria Jurídica do CREMERJ

QUESTÕES ACERCA DE PRESCRIÇÃO GENÉRICA DE MEDICAMENTOS FEITA POR ENFERMEIROS E SOBRE A POSSIBILIDADE DE UNIDADE MÉDICO-ASSISTENCIAL PODER SER DIRIGIDA POR PROFISSIONAL DE SAÚDE QUE NÃO SEJA DE FORMAÇÃO MÉDICA.

EMENTA: Esclarece que a consulta de enfermagem, instituída pela Lei n. 7.498/86, defere aos membros daquela profissão a possibilidade de autonomamente aconselhar e dar pareceres sobre atos típicos de enfermagem, não compreendendo neste conceito a faculdade de prescrever, genericamente, medicamentos. Afirma que a chefia administrativa das unidades de saúde pode ser exercida por profissional não médico, mas que a responsabilidade técnica das referidas unidades é sempre conferida a médico.

CONSULTA: Consulta formulada pela Consª A. N. P. A., da Diretoria do CREMERJ, acerca de prescrição genérica de medicamentos feita por enfermeiros, fato que estaria ocorrendo em Volta Redonda sob o conhecimento da Secretaria Municipal de Saúde. Indaga ainda se seria possível uma unidade médico-assistencial ser dirigida por profissional de saúde que não tenha formação médica.

PARECER: Solicita a Conselheira A. N. P. A. urgente manifestação da Assessoria Jurídica a respeito de fatos ocorridos em Volta Redonda e que são objeto de atenção da Delegacia Regional do Sul Fluminense do CREMERJ.

Trata-se do seguinte:

Contando com o pleno apoio da Secretaria Municipal de Saúde, enfermeiros estão prescrevendo genericamente medicação, o que gerou reação de médicos e do próprio Coordenador Geral da Delegacia contra este estado de coisas.

Indaga-se, assim, se esta prática é conforme o Direito, mencionando-se a propósito a Lei n. 7.498/86, a Resolução CFM n. 1.342, de 08 de março de 1991, e as Normas Técnicas Especiais para a Fiscalização do Exercício Profissional e de Estabelecimentos, de interesse para a medicina e para a saúde pública, que são acompanhadas de cópias de receituário feita pela enfermeira M. C. S. R. do A.

Através do ofício n. 1.948/96, datado de 27 de dezembro de 1996, a referida Secretaria, em apoio ao que vem acontecendo, comunica que “a consulta de enfermagem, atividade privativa do enfermeiro, está legitimada no Brasil desde 1986”,  apontando ainda que tal se dá em países outros que menciona, onde já se desenvolve esta atividade há vários anos, com grande eficácia, o mesmo ocorrendo em Estados de nossa Federação.

Referencia mais, com detalhes, a experiência de Volta Redonda, culminando por fixar que a consulta de enfermagem “ ... tem por finalidade contribuir para a efetivação dos princípios da universalidade, eqüidade, resolutividade e integralidade das ações de saúde.”

Em posição inteiramente oposta, o Coordenador Geral da Delegacia Regional Sul Fluminense diz que a Lei n. 7.498/86, que se refere ao exercício da enfermagem, deve ser interpretada restritivamente, de modo que os procedimentos em tela “... só poderão ser realizados por aqueles profissionais quando estabelecidos em Programas de Saúde, por exemplo AIDS, Tuberculose, Internação Domiciliar etc. e que, na verdade, não se trata de prescrição médica e sim de um fornecimento de liberação de medicação ou exames previamente prescritos e orientados pelo profissional  médico, a quem cabe de fato e direito a responsabilidade da Diagnose e Terapêutica”.

Há, lateralmente, indagação feita pelo Dr. R. J. de P. N. quanto à possibilidade de unidade médico-assistencial poder ser dirigida por profissional de saúde que não seja de formação médica.

É o relatório que passo a opinar:

O centro da questão situa-se na definição do que seja consulta de enfermagem, o que deve ser averiguado à luz do disposto na Lei n. 7.498, de 25 de junho de 1986, que criou o instituto.

De fato, pesquisando sobre a normatização da profissão de enfermeiro, desde a edição do Decreto n. 20.931, de 11 de janeiro de 1932, não se encontra dispositivo similar, certo mais que, à época, os enfermeiros especializados em obstetrícia e as parteiras deviam apenas limitar-se aos cuidados indispensáveis às parturientes e aos recém-nascidos. Quando houvesse anormalidade, deviam reclamar a presença de um médico.

Àquela altura - vide artigo 37, alínea d -, era expressamente vedado a esta categoria prescrever medicamentos, salvo se urgentemente reclamado pela necessidade de evitar ou combater acidentes graves que comprometessem a vida da parturiente, do feto ou do recém-nascido e isto até a chegada do médico que, mesmo aqui, era obrigatoriamente convocado, havendo anormalidade.

Com o advento da Lei n. 7.498, operou-se evidente modificação na situação anterior até pela consideração de que, muito mais que aspectos meramente corporativos, as leis de regência das profissões de saúde devem buscar reforçar o respeito mútuo, a liberdade e a independência de cada uma delas, objetivando sempre o bem-estar do paciente e da coletividade, princípio este que, entre nós, é reproduzido no artigo 18 do Código de Ética Médica.

A consulta de enfermagem é prevista na alínea i, do inciso I, do artigo 11, da Lei em comento, sendo atividade privativa do enfermeiro, o que afasta de imediato a possibilidade de ser ela feita por técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem ou por parteira, que são atividades auxiliares da enfermagem.

Inexistindo embora na Lei n. 7.498 o aclaramento do que seja consulta de enfermagem, é fora de dúvida, contudo, que, se consulta podem dar, só poderão fazê-lo em relação ao que lhes seja pertinente, relativamente àquelas matérias que são típicas da enfermagem.

De se notar que no inciso II, do mesmo artigo 11, alínea c, é estabelecido que, como integrante da equipe de saúde, pode o enfermeiro prescrever medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em rotina aprovada pela instituição de saúde, o que se constitui em significativo avanço se comparado com a disciplina ditada pelo Decreto n. 20.931/32, mas ao mesmo tempo impondo dialética limitação a novel faculdade, o que só por si resolve o problema.

Penso, porém, que se deva investigar sobre o que antes era estabelecido, até para se cotejar com o que é vigente, o que ao meu ver permitirá uma visão mais panorâmica sobre o assunto.

Indo adiante, há precisa definição de quais os atos que se compreendiam no campo profissional de enfermagem no artigo 2º do Decreto n. 50.387, de 28 de março de 1961, que pela importância de que se reveste, merece transcrição:

“Art. 2º  O  exercício  de  enfermagem  e  de suas funções auxiliares
compreende a execução de atos que nos seus respectivos campos profissionais visem a:
a) observação,  cuidado   e   educação   sanitária    do    doente, da
gestante ou do acidentado;
b) administração   de   medicamentos e tratamentos prescritos por
médicos;
c)educação   sanitária  do  indivíduo, da  família  e de outros grupos
sociais para a conservação e recuperação da saúde e preservação das doenças.”

No artigo 15, ainda do Decreto n. 50.387/61, há expressa vedação para o pessoal de enfermagem instalar consultórios para atender clientes, bem como para administrar medicamentos sem prescrição médica, salvo nos casos de extrema urgência.

Eram, sem dúvida alguma, tempos em que a enfermagem não gozava do prestígio que hoje tem, em que era enxergada como tarefa menor, culturalmente distanciada daquelas outras profissões cujos membros também passaram pelos bancos escolares do terceiro grau de ensino.

Bem, é certo que a Lei n. 7.498 é um marco na direção da superação deste preconceito, nela se contendo precisa definição sobre as atividades, privativas e em equipe, da enfermagem, não havendo alteração digna de nota no regulamento dela, dado pelo Decreto n. 94.406, de 08 de junho de 1987, que no artigo 8º, inciso II, letra c, reproduz o permissivo da prescrição de medicamentos nas mesmas condições daquela.

E aí tendo atividades típicas como a assistência à parturiente e ao parto normal, por exemplo, nada mais tranqüilo do que, quanto a estas atividades, insista-se, realizar consultas.

Este nos parece o significado real da consulta de enfermagem, que nada tem a ver com a atuação limitada e desprendida de qualquer controle que é defendida pela Secretaria Municipal de Saúde de Volta Redonda, e que se revela no receituário acostado.

Aliás, no bojo do ofício que enviou ao Coordenador da Delegacia Sul Fluminense, reconhece a autoridade que a prescrição de medicamentos que se faziam, diziam respeito exclusivamente àqueles normatizados pelo Ministério da Saúde, aos pacientes com diagnósticos médicos já confirmados, bem como à indicação de medicamentos e tratamentos, exames laboratoriais, orientação alimentar etc.,... são apenas aqueles estabelecidos pelos serviços de saúde.

Destaque-se, para além disso, que a Resolução CFM n. 1.342/91, na hipótese, nada acrescenta ao debate nem as demais contidas no expediente.

E isto porque a Resolução cuida, como é natural, de questões intramuros, destinando-se exclusivamente a reger o comportamento ético de médicos, não atingindo outras categorias.

É claro que a chefia de serviços médicos só pode ser exercida por médico, assim como a chefia de enfermagem há de ter um enfermeiro à sua frente.

Induvidoso também que o Diretor Técnico e o Diretor Clínico hão de ser médicos, o que todavia não quer dizer que a chefia de uma unidade de saúde tenha que ser necessariamente entregue a membro da categoria.

A razão suprema para tanto é não se confundir a responsabilidade técnica que, enquanto tal, e perante a Secretaria de Saúde, o Serviço de Vigilância Sanitária e o Conselho Regional de Medicina, é encargo conferido exclusivamente a um médico, com a responsabilidade administrativa que é detida pelo diretor da unidade de saúde, e que pode ser conferida a qualquer profissional, da área ou não.

Feitas estas observações, concluo:

a) a chefia administrativa das unidades de saúde pode ser exercida por profissional não médico;

b) a responsabilidade técnica das referidas unidades é sempre conferida a médico;

c) a consulta de enfermagem, instituída pela Lei n. 7.498/86, defere aos membros daquela profissão possibilidade de autonomamente aconselhar e dar parecer sobre atos típicos de enfermagem;

d) não se compreende no conceito a faculdade de prescrever genericamente medicamentos;

e) o limite estabelecido na Lei em referência, bem como no Decreto que a regulamentou, é exclusivamente para a prescrição de medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em protocolos e rotinas aprovados pela instituição de saúde, não podendo o enfermeiro ir além do que é permitido, sob pena de subversão completa do mandamento;

f) os louváveis princípios invocados pela Secretaria Municipal de Saúde não podem ser interpretados de forma tão elástica a ponto de gerar confusão entre as tarefas típicas do enfermeiro e as diferentes especialidades médicas; e

g) em se tratando de equivocada compreensão sobre o alcance da consulta de enfermagem, indico que antes da adoção de quaisquer medidas tendentes a fazer cessar a prática de atribuições exclusivas da profissão médica por profissional não integrante da categoria, que se envie notícia à autoridade, em breve resumo, das  conclusões básicas deste parecer.

É o que me parece, salvo melhor juízo.
 
(Aprovado em Sessão Plenária de 14/11/97)


Não existem anexos para esta legislação.

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