
PARECER CREMERJ N. 54/1997
INTERESSADO: Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de
Janeiro
RELATOR: Cons. Rui Haddad
Comissão de Ensino Médico do CREMERJ
CRIAÇÃO DE 13 NOVAS ESCOLAS DE MEDICINA NO PAÍS, CONFORME PROPOSTAS EXISTENTES NO MEC.
EMENTA: Afirma que a criação de 13 novas escolas de Medicina no País, conforme propostas existentes no MEC, não encontra qualquer justificativa com base nas necessidades da população, e só pode servir a interesses não relacionados à saúde das pessoas. Esclarece que o CREMERJ é claramente contra a criação de novas faculdades de Medicina.
CONSULTA: O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro solicita à Comissão de Ensino Médico do CREMERJ parecer acerca da proposta de criação de novas escolas de medicina no País.
PARECER: A criação de 13 novas escolas de medicina no país, conforme propostas existentes no MEC, não encontra qualquer justificativa com base nas necessidades da população, e só pode servir a interesses não relacionados à saúde das pessoas.
O Brasil conta atualmente com 84 faculdades de medicina, sendo que a grande maioria concentrada na Região Sudeste, onde existem 60% do total de 220.000 médicos registrados. Dados dos Ministérios da Educação e da Saúde e do IBGE demostram que a taxa de crescimento anual do número de médicos formados pelas escolas existentes é de 3,73%, ou seja, duas vezes a taxa de crescimento da população geral, que é de 1,89%. Dispomos, no momento, de uma relação de profissionais médicos maior que a preconizada pela OMS, que é de 1 médico para 1000 habitantes (a relação atual é de cerca de 1 médico para cada 700 habitantes). Com isto, milhares de médicos estão sub-empregados, sem condições mínimas para atender a população com dignidade.
Mais significante que estes dados numéricos são os dados de qualidade, isto é, grande número de escolas médicas, por não possuírem as condições mínimas requeridas para ministrar cursos de alta qualidade, colocam no mercado profissionais despreparados para exercerem uma profissão que exige longo tempo de formação, treinamento rígido em serviço e alto padrão ético, ensinado por professores com sólida formação científica e moral.
A população torna-se vulnerável aos médicos mal formados e mal treinados, pois, na maioria das vezes, não cumpre a ela julgar a capacidade técnica do médico. Os alunos, ávidos por entrarem numa faculdade, não têm conhecimento, discernimento e nem senso crítico formado que os permitam reconhecer as dificuldades e os problemas que enfrentarão em uma escola deficiente. Isto pode frustrá-los para o resto da vida, uma vez que se encontram, desta forma, comprometidos numa trajetória profissional que não tem mais volta.
A quem interessa esta pletora de profissionais despreparados?
Historicamente, são as faculdades públicas as que possuem melhores condições ou facilidades para formação dos novos profissionais e onde se encontra o corpo docente com maior qualificação. A falta de professores com alta especialização e titulação dificulta muito a formação de novas escolas. Apesar disso, novas escolas médicas vêm sendo criadas nos últimos 30 anos, sem critérios ou razões lógicas. Segundo dados recentes da CINAEM (Comissão Inter-Institucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico), a titulação acadêmica dos docentes das escolas médicas é em geral muito pobre, especialmente a das escolas particulares, hoje dominantes em termos numéricos. A maioria dos docentes tem como titulação mais alta apenas a residência médica (80,3%), sendo titulados com o grau de mestre 30,5% e com o grau de doutor apenas 18,5% . É importante salientar que só 7% deles são especialistas em educação.
Onde buscar professores qualificados para o grande número de escolas médicas, sejam as já existentes, sejam as que se propõem criar?
Até 1965 existiam no País 21 faculdades públicas de medicina e 6 faculdades particulares. Após esta data foram criadas 6 faculdades públicas e dezenas de faculdades particulares, atingindo o total atual de 84 faculdades. São oferecidas, anualmente, 8.130 vagas para os cursos de medicina, sendo 1.860 só no Estado de São Paulo. Assim, a criação de novas escolas onde elas já existem em excesso é, no mínimo, uma irresponsabilidade e a criação da grande maioria delas não obedeceu a nenhum planejamento estratégico, não apresentando, por isto, condições mínimas para ministrarem um ensino de alta qualidade como a formação médica exige.
A criação de novas faculdades de medicina poderia ser entendida e até teoricamente explicável em áreas nitidamente carentes de médicos ou no caso especial de apresentarem modelos pedagógicos com propostas comprovadamente revolucionárias e inovadoras. Mesmo assim, restariam problemas de difícil solução, quais sejam os locais de treinamento para os alunos (hospitais-escola, laboratórios o outras facilidades) e o recrutamento de docentes qualificados.
No Estado do Rio de Janeiro, estão em funcionamento as seguintes escolas médicas: UFRJ, UERJ, UNIRIO, UFF, Universidade Gama Filho, Souza Marques, Faculdade de Medicina de Valença, Vassouras, Universidade de Nova Iguaçu, Faculdade de Medicina de Volta Redonda, Faculdade de Medicina de Campos, Faculdade de Medicina de Petrópolis, Faculdade de Medicina de Teresópolis.
Não parece justificável a criação de novas escolas no Estado do Rio de Janeiro.
A rede hospitalar é deficiente em diversos aspectos funcionais, dificultando o treinamento apropriado dos novos profissionais.
Atualmente, cursos de pós-graduação, incluindo os de residência médica, não são capazes de absorver um grande número dos profissionais já formados e muito menos dos futuros, caso sejam criadas novas escolas. Atualmente, apenas 30% dos médicos formados no Brasil têm acesso à residência médica, etapa fundamental para a formação de profissionais qualificados.
O que representa para a saúde da população brasileira esta massa de profissionais sem formação mínima adequada?
Os governantes do País podem ser responsabilizados pelas conseqüências que certamente daí advirão?
Que objetivos escondem-se por trás desta proliferação irresponsável de novas escolas médicas?
No Estado do Rio de Janeiro, neste ano, foram realizados vestibulares para 3 novas escolas de medicina, tendo outras 3 anunciado o desejo de criar seus cursos médicos. No Brasil está planejada a criação de mais de 50 novos cursos na área de saúde, incluindo medicina, enfermagem, nutrição e afins, apesar de Pareceres contrários do Conselho Nacional de Saúde.
Há possibilidade de ensinar adequadamente estes novos alunos?
Há possibilidade de treinamento ou planejamento para melhorar e oferecer oportunidades decentes para os profissionais que sairão, em alguns anos, destas escolas?
Há mercado de trabalho para absorver dignamente esta mão-de-obra?
Evidentemente que a resposta é NÃO.
Então, por que não cortar esta mal pela raiz, com a única atitude possível, que seria a de impedir que isto ocorra, e se torne irreversível? Existem critérios mínimos bem definidos internacionalmente para que uma escola médica possa funcionar e exercer sua função de formar profissionais altamente qualificados. Por que não aplicar então estes critérios às escolas já existentes?
O Conselho Regional de Medicina, Órgão fiscalizador da profissão médica, quer que os profissionais formados anualmente nas escolas médicas do País tenham a devida qualificação e que as escolas médicas existentes só possam continuar a formar médicos se tiverem condições mínimas para tal. Exige-se qualidade e não quantidade.
Deve-se frisar que, além de tudo o que foi dito, como se não fosse por si suficiente, a criação de novas escolas médicas é uma nítida desobediência à legislação vigente e uma afronta direta às entidades médicas nacionais e regionais que, reiteradamente, se manifestaram e continuam se manifestando veementemente contra este fato. Assim, manifestamos-nos claramente contra a criação de novas faculdades.
Esperamos ansiosamente pelas providências das autoridades, pois a saúde de todos nós está em jogo.
(Aprovado em Sessão Plenária de 11/06/1997)
Não existem anexos para esta legislação.
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