
PARECER CREMERJ N. 102/2002
INTERESSADO: Dr. L. J. de H. S.
RELATOR: Cons. Jorge Wanderley Gabrich
COBRANÇA DE HONORÁRIOS MÉDICOS A PACIENTES
ASSISTIDOS PELO SUS.
EMENTA: Não é permitida a cobrança de honorários por profissionais que pertençam ao quadro do hospital público, ou conveniado com o SUS, como complemento dos serviços prestados. É permitida a cobrança de honorários quando o médico não pertencer ao quadro de funcionários do hospital e para lá é requisitado pelo paciente, familiares ou pela Direção do Hospital.
CONSULTA: Consulta encaminhada por profissional médico, o qual expõe trabalhar em uma fundação privada, sem fins lucrativos, em cujo hospital existem instalações distintas para atendimento ao SUS e para atendimento privado, com a mesma equipe médica trabalhando em regime de plantão no Serviço de Pronto Atendimento, ou como diaristas, nas rotinas dos serviços. Informa, ainda, que a equipe médica tem que atender a todos os pacientes que procurem o hospital, sejam oriundos do SUS ou privados. O Consulente, por fim, faz as seguintes indagações ao CREMERJ:
"1. É lícito que o médico cobre seus honorários profissionais quando o atendimento for prestado a pacientes privados?
2. É lícito que a instituição cobre os valores referentes aos honorários profissionais e não os repasse ao médico, sob a alegação de que já recebem um salário fixado no contrato de trabalho para cumprir a carga horária estabelecida?"
PARECER: Trata o presente documento da tentativa de elaborarmos uma resposta a várias consultas que chegam ao nosso Conselho questionando estar o médico autorizado ou não a cobrar honorários a pacientes assistidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Para podermos entender o questionado precisamos classificar as diversas relações profissionais mantidas pelos médicos com os usuários do Sistema.
Assim, dividimos os médicos em 6 (seis) categorias, de acordo com a sua relação com estes pacientes.
1 - Médico pertencente ao quadro de funcionários de hospital público, que atende aos usuários do Sistema no próprio hospital.
2 - Médico pertencente ao quadro de funcionários do hospital público, que para lá leva paciente de sua clínica para atendimento.
3 - Médico pertencente ao quadro de funcionários de hospital privado, conveniado com o SUS, que lá assiste aos pacientes do Sistema.
4 - Médico não pertencente ao quadro de funcionários de hospital público, que lá é chamado pelo paciente, ou seu representante, para uma avaliação ou acompanhamento.
5 - Médico não pertencente ao quadro de funcionários de hospital conveniado com o SUS, que lá comparece para atender aos usuários do Sistema, por solicitação dos mesmos ou de seus familiares.
6 - Médico não pertencente ao quadro de funcionários de hospital privado conveniado com o SUS que lá comparece para atender aos usuários do Sistema por solicitação do hospital conveniado.
Os artigos do nosso Código que tratam da relação de médicos com o paciente do Sistema Público de Saúde são os de números 93, 94 e 95.
O artigo 93 é bem claro e não se aplica ao objetivo de nossa análise.
Dentro da Sistematização acima referida começaremos a discutir caso a caso. Naqueles contidos na definição 1, o artigo 95 do nosso Código é perfeitamente aplicável, ficando claro não poder haver cobrança.
"É vedado ao médico:
Art. 95 - Cobrar honorários de paciente assistido em instituição que se destina à prestação de serviços públicos; ou receber remuneração de paciente como complemento de salário ou de honorários."
O mesmo se aplica para aqueles contidos na definição 2, porém o artigo cabível, além do 95, é o de número 94.
"É vedado ao médico:
Art. 94 - Utilizar-se de instituições públicas para execução de procedimentos médicos em pacientes de sua clínica privada, como forma de obter vantagens pessoais."
Continuando nossa análise, temos aqueles classificados na categoria 3, que também, no nosso entendimento, não podem ser objetos de cobrança, posto que aí se caracterizaria, como também nos casos acima, um duplo recebimento por parte do médico pelos serviços prestados.
Aquele a que se refere a categoria 4 da nossa classificação acreditamos ser correto que o médico cobre os seus honorários, posto que lá foi chamado a comparecer pelo paciente ou seus representantes. Como o médico não tem o seu trabalho remunerado, não vemos como recomendar ao profissional que não cobre os valores que achar como justos pelo seu trabalho.
Restaram para serem respondidos o procedimento de médico naqueles casos englobados nos itens 5 e 6. Aí estão os casos mais complexos e também os mais comuns no interior de nosso Estado, onde a carência de leitos públicos é grande, sendo suprida parcial e precariamente através dos convênios estabelecidos pelo SUS com os hospitais privados. As questões envolvendo a cobrança de honorários médicos aos pacientes usuários do SUS nestes hospitais têm se avolumado por algumas poucas e importantes razões.
Em primeiro lugar estão os baixos valores praticados pelo SUS no pagamento dos honorários médicos. A insensibilidade da classe dirigente à questão do aviltamento do trabalho do médico fornece o caldo de cultura para o crescimento da insatisfação entre os profissionais. É cada vez maior o número de médicos, em todo o País, que deixa de se submeter à remuneração vil, não mais atendendo aos pacientes do SUS.
Ressalte-se que, diretamente relacionada aos valores irrisórios praticados pelo SUS, está a queda na qualidade do trabalho médico e seus conseqüentes conflitos com o nosso Código de Ética.
Além da omissão governamental no trato da questão da tabela de honorários do SUS, temos outros protagonistas importantes no cenário que envolve a assistência aos usuários do SUS no interior do Estado. Estes protagonistas são os hospitais privados, ditos filantrópicos, conveniados com o Sistema.
Essas instituições reservam parte dos seus leitos à assistência aos usuários do SUS e para isso são beneficiadas com isenções tributárias que, aparentemente, compensam os valores deficitários com que são pagos. Os médicos pertencentes ao Corpo Clínico dessas instituições assistem aos usuários dos Planos de Saúde e particulares e são chamados também a atender os usuários do SUS.
É a política do chamado "toma lá dá cá", na qual o hospital acena com os benefícios do direcionamento da clientela dos Planos de Saúde para que o médico assuma o ônus de assistir aos beneficiários do Sistema Público. Ocorre, no entanto, que aos médicos não são concedidas as isenções tributárias que beneficiam essas instituições.
Assim sendo, a dupla via que se pretendia nessa relação acaba existindo somente em uma direção, beneficiando apenas um dos parceiros, que são os hospitais ditos filantrópicos. Ao médico resta somente atender aos pacientes internados nos leitos destinados ao SUS, que hoje paga, via de regra, R$ 2,50 por uma consulta hospitalar.
Está mais do que evidente que o médico não está sendo adequadamente remunerado pelos seus serviços.
Na direção de "legalizar" esta relação perversa, alguns hospitais, na defesa de seus interesses, já inserem em seus regulamentos artigos que prevêem que os membros de seus corpos clínicos são aqueles médicos que estão "desenvolvendo suas atividades profissionais nos diversos serviços e clínicas do hospital, (...), atendendo indistintamente todos os convênios que o hospital mantiver, inclusive o SUS - Sistema Único de Saúde."
Resta porém uma diferenciação entre as categorias 5 e 6 da nossa sistematização. Na primeira, temos a solicitação da presença do médico por parte do paciente ou de seus representantes. Na outra, a chamada é feita pelo hospital conveniado. É nossa compreensão que na categoria 5 cabe ao paciente arcar com os custos adicionais de sua assistência, aplicando-se aqui o mesmo entendimento dado à definição 4. Na categoria 6, cabe ao hospital que solicitou a presença do profissional o pagamento justo ao médico pelo seu serviço.
Na fixação dos seus honorários e no atendimento desses pacientes, o médico nunca deverá perder de vista a função humanitária de nossa profissão, ficando sempre atento aos artigos do nosso Código que visam evitar a omissão de socorro e a ganância na relação com os pacientes.
Os artigos 58, 89 e 90 prescrevem ser vedado ao médico:
"Art. 58. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados profissionais em caso de urgência, quando não haja outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo."
"Art. 89. Deixar de se conduzir com moderação na fixação de seus honorários, devendo considerar as limitações econômicas do paciente, as circunstâncias do atendimento e a prática local."
"Art. 90. Deixar de ajustar previamente com o paciente o custo provável dos procedimentos propostos, quando solicitado."
Finalmente, frisamos que as questões envolvendo o relacionamento entre o médico que é chamado a avaliar um paciente internado e a equipe que lhe assiste não foi objeto da consulta inicial, não sendo, portanto, analisadas neste Parecer.
É o parecer, s. m. j.
(Aprovado em Sessão Plenária de 26/07/2002)
Não existem anexos para esta legislação.
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