
PARECER CREMERJ N. 127/2003
INTERESSADO: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro / 1ª Promotoria de Justiça de Proteção aos Interesses Difusos e Direitos Coletivos / 9º Centro Regional de Apoio Administrativo e Institucional - Teresópolis
RELATOR: Cons. Marcos André de Sarvat
Câmara Técnica de Otorrinolaringologia do CREMERJ
QUESTÕES RELATIVAS AOS RISCOS DA EXPOSIÇÃO DO OUVIDO HUMANO A SOM ELEVADO - EM AMBIENTE FECHADO
EMENTA: Expõe que, no caso da poluição sonora, o ruído é uma condição subjetiva causadora de desconforto. Afirma que o nível de pressão sonora, dependendo de sua magnitude, do ambiente e da susceptibilidade e tempo de exposição do indivíduo, é causa objetiva de perda auditiva, capaz de produzir lesão no aparelho auditivo.
CONSULTA: Consulta encaminhada pela Dra. S. C. V. F., Promotora de Justiça, a qual investiga a utilização de equipamento de som tipo bazuca de grande potência em veículos automotores e, assim, solicita parecer médico sobre os riscos da exposição do ouvido humano a som elevado, em ambiente fechado.
PARECER: A fim de melhor subsidiar o Ministério Público quanto aos vários aspectos da questão, esclarecemos que quando se fala em poluição tem-se, de imediato, a idéia de contaminação por alguma coisa nociva, que faz mal à saúde. Assim ocorre no que diz respeito à poluição das águas e do ar, em que algo pode tornar esses elementos impróprios para uso ou para o consumo.
Outra forma de poluição possível de ameaçar homens (e até animais) é aquela onde, mesmo não existindo risco direto à saúde, o fator poluente favorece alguma forma de desconforto no aspecto sensorial, como é o caso da poluição sonora e visual, entre outras.
Num sentido mais amplo, poluir é transformar um elemento, um ambiente, uma paisagem, numa condição capaz de colocar em risco a saúde de forma direta, pela lesão imposta, ou indireta, pelo desconforto decorrente do tipo de poluição.
No caso da poluição sonora, o ruído é uma condição subjetiva causadora de desconforto. O nível de pressão sonora, dependendo de sua magnitude, do ambiente e da susceptibilidade e tempo de exposição do indivíduo, é causa objetiva de perda auditiva, capaz de produzir lesão no aparelho auditivo.
Sons com níveis de pressão sonora a partir de 80 dB, medidos na escala "A" de aparelho medidor de pressão sonora (decibelímetro), apresentam risco de causar perdas no sentido da audição, sob o aspecto objetivo.
Subjetivamente, dependendo das características de timbre, harmonia, o tempo ou a freqüência de sua ocorrência, entre outras, mesmo não possuindo intensidade suficiente para provocar lesão auditiva, alguns sons são passíveis de causar intensa perturbação do equilíbrio emocional, principalmente nas situações em que possa de alguma forma interferir no repouso. Observam-se, portanto, dois atributos: um quantitativo (objetivo) e outro qualitativo (subjetivo), capazes de causar problemas de saúde.
Determinados sons considerados agradáveis para algumas pessoas são percebidos como ruídos incômodos por outras. O que torna um som agradável ou incômodo é a sensação dita subjetiva agregada àquele determinado som, no inconsciente do indivíduo, que o perceberá como agradável, capaz de dar-lhe prazer ou, como insuportável, causar-lhe stress.
Cientificamente está comprovado que, tomando-se por padrão a imensa maioria das pessoas, a exposição a sons com níveis de pressão de 80 dB (A) por até 8 (oito) horas diárias ou o seu equivalente, é segura no que diz respeito à lesão auditiva. Variando-se os níveis de pressão sonora e o tempo de exposição de forma inversamente proporcional, pode-se ficar mais ou menos exposto, a sons de diversas magnitudes, sem que haja, necessariamente, risco de lesão auditiva.
Porém, sons de baixo volume, em determinadas situações, podem incomodar até mais do que sons altos. Tomemos por exemplo a pia de um banheiro pingando e alguém que teve um mau dia, de seu quarto, tentando dormir, escutando o gotejar. Tal som é percebido como extremamente irritante. Reação diferente tem aquele que, sentindo-se bem, satisfeito, tranqüilo, pode até não escutar o gotejamento, ou mesmo se dando conta dele, ignorá-lo sem que isso o deixe irritado.
Por essas razões, deve-se normatizar, disciplinar, impor limites aos níveis de pressão sonora quando elevados, em determinados ambientes abertos ou fechados, pelo risco de lesão auditiva às pessoas presentes naquele local, conscientizando-as do perigo a que eventualmente podem estar expostas e as formas de se protegerem.
Há também que se respeitar o direito de vizinhança, para que os cidadãos, em especial os enfermos (físicos ou mentais), os ansiosos, os insones, os que necessitam de maior silêncio para o repouso (diurno ou noturno) ou para se concentrarem no trabalho, no estudo, na leitura ou no simples lazer, não sejam obrigadas a ouvir sons produzidos por alguém em níveis capazes de lhes causar algum tipo de desconforto, frisamos, independentemente da intensidade do som.
Vale aqui citar, sugerindo iguais providências de Vossa Senhoria, os injustificáveis sinais sonoros de portões de garagem, criados por leis que ignoram tais necessidades e a obrigatoriedade do motorista trafegar mui cuidadosamente pela calçada, bem como os carros de som de propaganda, apitos infindáveis de guardas, buzinas de carro para abertura de portões ou simples chamado de outra pessoa (contrariando o disposto no Código de Trânsito), e por aí vamos longe numa infinidade de sons.
Tais emissões, tão desnecessárias quanto inoportunas, contribuem para neurotizar a população, que, curiosa e normalmente não associa seu estado de ansiedade ao ruído ambiental, e dele só tomando consciência quando viaja para um local silencioso e percebe o "bem estar e a tranqüilidade" ali obtidos.
Os níveis sonoros, no interior de um ambiente, devem ter por princípio o não desencadeamento de perdas auditivas de seus freqüentadores e, externamente, além disso, o respeito do direito ao conforto auditivo dos vizinhos.
A Medicina e a Engenharia estão à disposição das autoridades competentes para auxiliá-las na árdua tarefa de buscar o ponto de equilíbrio para tão delicada questão, com base em normas técnicas já existentes, oriundas do conhecimento científico do assunto.
Nesse sentido, podemos acrescentar alguns dados bem mais "palpáveis" ou "audíveis", tais como:
1. A exposição continuada ao nível de pressão sonora elevada (NPSE) pode provocar uma diminuição gradual da acuidade auditiva devido à lesão que pode ocorrer no ouvido interno (cóclea). Esse tipo de perda auditiva é do tipo neurossensorial e conhecida como PAINPSE (Perda Auditiva Induzida por Níveis de Pressão Sonora Elevados), e equivocadamente denominada no passado como PAIR (Perda Auditiva Induzida pelo Ruído)
Por atingir a cóclea, o indivíduo portador de PAINPSE pode desenvolver intolerância a sons mais intensos, perda da capacidade de reconhecer as palavras, eventualmente zumbido e que, somando-se à deficiência auditiva propriamente dita, prejudicará o processo de comunicação - vide OS-608 INSS Sessão 1-1.2.
A Norma Reguladora n. 15, que trata de insalubridade, determina em seu Anexo I - transcrito parcialmente abaixo, que existem limites de tempo para exposição às diversas intensidades de nível de pressão sonora (som contínuo ou intermitente).
Assim, vale observar o óbvio: em termos de risco de lesão pela exposição, quanto maior o número de decibéis, menor deverá ser o tempo de exposição do indivíduo à fonte em questão.
ANEXO - NR 15
LIMITES DE TOLERÂNCIA PARA RUÍDO CONTÍNUO
OU INTERMITENTE
NÍVEL DE RUÍDO dB (A) - MÁXIMO EXPOSIÇÃO DIÁRIA PERMISSÍVEL
85dB - 8 h 86dB - 7 h 87dB - 6 h 88dB - 5 h 89dB - 4 h 30 min
90dB - 4 h 91dB - 3 h 30 min 92dB - 3 h 3dB - 2 h 40 min 94dB - 2 h 15 min
95dB - 2 h 96dB - 1 h 45 min 98dB - 1 h 15 min 100dB - 1 h 102dB - 45 min
104dB - 35 min 105dB - 30 min 106dB - 25 min 108dB - 20 min 110dB - 15 min
112dB - 10 min 114dB - 8 min 15dB - 7 min
Como foi citado o caso de carro equipado com sistema de som tipo "bazuca", podem, além de recomendar que sejam mensurados os níveis de pressão sonora gerados por tais equipamentos, exemplificar alguns níveis de intensidade sonoros nocivos de nosso dia-dia, em medidas aproximadas:
Shows: 102 a 116 dB
Trio elétrico: 104 a 114 dB
Orquestra sinfônica: 107 dB
Cultos: 89 a 97 dB
Assinalamos que se relacionarmos tais níveis ao tempo máximo de exposição protegido de riscos de prejuízo auditivo, veremos que se está tolerando a exposição da população a intensidades sonoras potencialmente mais lesivas do que deveriam.
Finalmente, manifestamos total solidariedade com a justa empreitada iniciada pelo Ministério Público, que há de em breve repercutir em todo o Estado, para bem do descanso, da tranqüilidade e, enfim, da paz e da saúde de nossa população.
É o parecer, s. m. j.
(Aprovado em Sessão Plenária de 30/04/2003)
Não existem anexos para esta legislação.
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