
PARECER CREMERJ N. 147/2003
INTERESSADA: INTERCOR - Investigação e Terapia do Coração
RELATORES: Cons. Cantídio Drumond Neto
Dr. Vinício Elia Soares
Câmara Técnica de Cardiologia do CREMERJ
Cons. Pablo Vazquez Queimadelos
Câmara Técnica de Terapia Intensiva do CREMERJ
QUESTÕES RELATIVAS À DEFINIÇÃO DAS ÁREAS DE ATUAÇÃO DO CENTRO DE TRATAMENTO INTENSIVO E DA UNIDADE CORONARIANA
EMENTA: Em pacientes com quadro agudo, que pode ter diferentes etiopatogenias como responsáveis, dúvidas podem ocorrer quanto à internação ser feita em Unidade de Terapia Intensiva ou em Unidade Coronariana, devendo-se buscar o consenso, entre ambas, para um melhor e mais pronto atendimento.
CONSULTA: Consulta encaminhada pela Dra. M. C. M. da R., diretora da INTERCOR, estrutura terceirizada do Hospital Espanhol, expondo que com a proliferação das Unidades de CTI e Coronariana em diversos hospitais, cada uma com interesses próprios, porém com indicações de internação de pacientes com patologias que freqüentemente se sobrepõem na sua indicação, tanto para um setor como para o outro. Solicita, assim, respaldo na definição das áreas de atuação de cada setor, mesmo sabendo que muitos casos têm características de difícil classificação. A profissional médica informa, ainda, que é responsável contratualmente pela área cardiológica do Hospital, que tem organizado um setor de Unidade Coronariana ao lado de um CTI administrado por um outro grupo. Indaga se em casos de dispnéia em que condições etiopatogênicas diferentes podem ser responsáveis (pneumonia e insuficiência mitral aguda por rotura de cordoalha), qual seria o destino a ser dado ao paciente e quem assumiria a responsabilidade pelo tratamento.
PARECER: A possibilidade de tratamento das arritmias da fase aguda do infarto do miocárdio, o desenvolvimento de técnicas de ressuscitação cardiopulmonar, a necessidade de suporte mecânico ventilatório em epidemias de poliomielite, entre outros, representam marcos históricos no desenvolvimento de Unidades de Terapia Intensiva.
Os avanços médicos e o desenvolvimento de recursos tecnológicos abriram espaço para Unidades de Terapia Intensiva especializadas no tratamento de pacientes cirúrgicos, de doenças cardíacas, de distúrbios neurológicos, de pacientes com insuficiência respiratória etc.
Algumas fronteiras, no entanto, nem sempre são precisas. Na realidade, as especializações médicas não devem deixar de considerar aspectos mais amplos e globais, fundamentais para o exercício profissional. Um plantonista de uma Unidade de Terapia Intensiva Cirúrgica deve ser qualificado para identificação e tratamento de arritmias cardíacas que induzam instabilidade hemodinâmica no pós-operatório de uma oclusão intestinal aguda. Um plantonista de uma Unidade Coronária deve ser apto para estabelecer uma via aérea artificial e instituição de
suporte mecânico ventilatório em um paciente com infarto agudo do miocárdio complicado com edema agudo de pulmão refratário.
Feitas tais ponderações passaremos à Consulta da Dra. M. da R.
Concordamos com a colocação da profissional médica que as indicações de internações em Unidades Coronárias e Unidades de Terapia Intensiva Gerais muitas vezes são superpostas.
Na realidade, o conceito da terapia intensiva cardiológica não é recente e já há alguns anos vem sendo enfatizado na literatura médica nas obras de William J. Sibbald (Cardiovascular Crises in the Critically III, Critical Care Clinics, 1985), Michael S. Ewer & Gerald V. Naccarelli (Cardiac Critical Care, Critical Care Clinics, 1989), David R Dantzker (Cardiopulmonary Critical Care, WB Saunders, 1991) e Vladimir Kvetan & David R Dantzkerv (The Critically III Cardiac Patient, Lippincott-Raven, 1996), entre tantos outros.
O próprio CREMERJ, em sua Resolução Normativa n. 111/96, estabelece, em seu artigo 1º, "Normas Mínimas para o Funcionamento de Unidades Especializadas no Tratamento do Paciente Crítico Cardiológico".
Na prática médica observada em Serviços Públicos da Cidade do Rio de Janeiro, onde não se fazem presentes "os interesses próprios de distintas unidades de estrutura hospitalar terceirizada", como bem cita a Consulente, as Unidades Coronárias, invariavelmente lotadas, não se restringem à assistência de pacientes com síndromes coronárias isquêmicas agudas, mas têm um campo de atuação que abrange emergências hipertensivas, arritmias cardíacas, doenças da aorta, insuficiência cardíaca de diversas etiologias e condições críticas em doenças do pericárdio e das válvulas cardíacas.
A importância da prática Cardiológica em Unidades de Terapia Intensiva também pode ser observada na própria Sociedade de Terapia Intensiva do Rio de Janeiro, que se apresenta com um Departamento de Cardiologia.
A seguir, atendendo solicitação da Consulta em questão, estamos relacionando doenças e/ou distúrbios nosológicos que podem ser abordados, tanto em termos de investigação diagnóstica quanto em termos de efetiva atuação terapêutica, em regime de internação em Unidades Especializadas no Tratamento do Paciente Crítico Cardiológico.
1. Síndromes Coronárias Isquêmicas Agudas.
a) Infarto agudo do miocárdio.
b) Complicações do infarto agudo do miocárdio (choque cardiogênico, arritmias etc).
c) Angina instável.
d) Condições isquêmicas miocárdicas que, embora imediatamente se apresentem estáveis, apresentem riscos de descompensação (exemplo: doença coronária previamente diagnosticada, sem evidências de condição isquêmica aguda, em paciente submetido a intercorrência clínica ou cirúrgica).
e) Doença coronária previamente diagnosticada, sem evidência de condição isquêmica aguda, em paciente submetido a intercorrência clínica ou cirúrgica.
f) Isquemia miocárdica em doenças coronárias obstrutivas não ateroescleróticas (vasculite etc), condições de aumento de consumo miocárdico não obrigatoriamente relacionado à doença coronária obstrutiva (miocardiopatia hipertrófica etc), isquemia miocárdica em condições diversas (vasoespasmo, síndrome X etc).
2. Procedimentos Hemodinâmicos.
a) Procedimentos hemodinâmicos diagnósticos em pacientes de alto risco.
b) Procedimentos hemodinâmicos intervencionistas (valvuloplastias; angioplastia coronária, de ramos supra-aórticos, de artérias renais etc., com ou sem implante de STENT).
c) Implantes de marcapasso definitivo e de dispositivos para desfibrilação ou tratamento de taquiarritmias, além de suporte para estudo eletrofisiológico em pacientes de alto risco.
3. Distúrbios Hemodinâmicos.
a) Insuficiência cardíaca de diversas etiologias (distúrbios isquêmicos miocárdicos, doença cardíaca hipertensiva, doença cardíaca orovalvar, doença primária miocárdica, doenças do pericárdio e doenças do endocárdio).
b) Choque com dinâmica cardiogênica ou obstrutiva e, eventualmente, choque com dinâmica distributiva ou hipovolêmica desde que se acompanhe de componente cardiogênico associado.
4. Parada Cardíaca e "Morte Súbita".
a) Paciente recuperado de "morte súbita" cardíaca e eventualmente não-cardíaca.
b) Fibrilação ventricular, taquicardia ventricular sem pulso, assistolia, atividade elétrica sem pulso (dissociação eletromecânica, pseudodissociação eletromecânica, ritmo idioventricular, bradicardia extrema etc)
5. Arritmias.
a) Taquiarritmias supra ou ventriculares, mecanismos reentrantes ou por alterações do automatismo, com ou sem comprometimento hemodinâmico imediato.
b) Bradiarritmias com ou sem comprometimento hemodinâmico imediato.
6. Emergências e Urgências Hipertensivas.
a) Hipertensão arterial sistêmica com comprometimento neurológico.
b) Hipertensão arterial sistêmica com disfunção ventricular esquerda.
c) Hipertensão arterial sistêmica com isquemia miocárdica.
d) Hipertensão arterial sistêmica com dissecção aórtica.
e) Hipertensão arterial sistêmica de evolução acelerada ou maligna.
f) Hipertensão arterial sistêmica relacionada a procedimentos cirúrgicos.
g) Condições diversas (feocromocitoma etc).
7. Distúrbios Vasculares Neurológicos.
a) Ataque isquêmico transitório e acidente vascular encefálico, particularmente de origem isquêmica, em pacientes elegíveis para terapia trombolítica.
8. Condições Diversas.
b) Pós-operatório de cirurgia cardíaca.
c) Dor torácica.
d) Síncope.
e) Condições de risco em doenças valvares.
f) Endocardite infecciosa.
g) Condições de risco em doença do pericárdio.
h) Hipertensão arterial pulmonar.
i) Cor pulmonale.
j) Embolia pulmonar.
k) Dissecção aórtica.
l) Trauma cardíaco.
m) Tumores cardíacos.
n) Resposta inflamatória sistêmica relacionada a distúrbios cardiológicos.
Em resposta à solicitação de opinião sobre o caso apresentado, julgamos não ser procedente o questionamento de internação em Unidade Coronária de um paciente sabidamente cardiopata, com instabilidade hemodinâmica decorrente de rotura de cordoalha tendinosa, com insuficiência mitral aguda, mesmo que o paciente apresente antecedentes de doenças de outros sistemas.
A internação deste mesmo paciente na Unidade de Terapia Intensiva, com o argumento de ser o distúrbio respiratório o fator precipitante do quadro, também não poderia ser alvo de crítica, pois, na dúvida, antes do estabelecimento diagnóstico definitivo o mais importante é o socorro imediato ao paciente.
Pelo exposto, somos de opinião que os procedimentos foram corretos e que em alguns casos, como o supracitado, ocorrem intercorrências cardiológicas e de terapia intensiva em um mesmo paciente, daí ser, certamente, recomendável que haja bom entrosamento entre as equipes dos dois serviços.
A Câmara Técnica de Terapia Intensiva do CREMERJ salienta que conforme conceituação da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) - através do Projeto Qualidade em Terapia Intensiva (QUATI) - a UTI especializada caracteriza-se pelo predomínio de pelo menos 80% dos pacientes internados terem a doença de base, referente à internação, identificada com a especialidade. Portanto, é recomendável, mas não impeditivo, que os pacientes possam ser recebidos nas unidades especializadas até para proteção do paciente.
É o parecer; s. m. j.
(Aprovado em Sessão Plenária de 03/09/2003)
Não existem anexos para esta legislação.
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