
PARECER CONSULTA nº 01/2021
PROCESSO PARECER CONSULTA Nº 26/2020
INTERESSADO: Dr. M.F.M.A. (Protocolo nº 10338834)
ASSUNTO: Auditoria Médica
RELATOR: Conselheiro Benjamin Baptista de Almeida
EMENTA: Existe responsabilidade, perante o Conselho Regional de Medicina, de auditor médico de operadora de saúde na emissão de parecer a respeito de cirurgia, quando da negativa de procedimento sem embasamento técnico, consoante artigos do Código de Ética Médica e Resoluções do CFM.
DA CONSULTA
O consulente nos solicita responder qual a responsabilidade do auditor da operadora de saúde, junto ao Conselho Regional de Medicina, no momento da emissão de um parecer a respeito de uma cirurgia. Justifica a solicitação por negativas de procedimentos sem embasamento técnico.
DO PARECER
A responsabilidade do médico auditor de operadora de saúde está estabelecida, entre outras normas, no Código de Ética Médica aprovado pela Resolução CFM nº 2.217, de 27 de setembro de 2018, descrito no Capítulo VII, RELAÇÃO ENTRE MÉDICOS, no artigo 52, que transcrevo: é vedado ao médico "desrespeitar a prescrição ou o tratamento de paciente determinado por outro médico, mesmo quando em função de chefia ou auditoria, salvo em situação de indiscutível benefício para o paciente, devendo comunicar o fato ao médico responsável" (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2018). Do mesmo modo, no Capítulo XI, Auditoria e Perícia Médica:
É vedado ao médico: [...]
Art. 97: Autorizar, vetar, bem como modificar, quando na função de auditor ou de perito, procedimentos propedêuticos ou terapêuticos instituídos, salvo, no último caso, em situações de urgência, emergência ou iminente perigo de morte do paciente, comunicando, por escrito, o fato ao médico assistente;
Art. 98: Deixar de atuar com absoluta isenção quando designado para servir como perito ou como auditor, bem como ultrapassar os limites de suas atribuições e de sua competência. (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2018)
Do mesmo modo, a Resolução CFM 1.401/1993, em seu artigo 1º estabelece que todas as operadoras de saúde “estão obrigadas a garantir o atendimento a todas as enfermidades relacionadas no Código Internacional de Doenças da OMS, não podendo impor restrições quantitativas ou de qualquer natureza” (CFM, 1993, Grifo Nosso). A mesma Resolução, em seu artigo 2º, letra “c” estabelece “ampla e total liberdade de escolha dos meios diagnósticos e terapêuticos pelo médico, sempre em benefício do paciente” (CFM, 1993, Grifo Nosso).
Já a Resolução CFM nº 1.642/2002 estabelece que as operadoras de saúde devem estar registradas nos Conselhos Regionais de Medicina de sua jurisdição, bem como respeitar a autonomia profissional dos médicos.
A referida autonomia profissional do médico é também consignada, entre outros, nos Pareceres CFM nº16/2015 e nº 11/2016.
A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar emitiu, em 14 de janeiro de 2016, a Resolução Normativa 395. Vejamos o seu artigo 10:
Art. 10 Havendo negativa de autorização para realização do procedimento e/ou serviço solicitado por profissional de saúde devidamente habilitado, seja ele credenciado ou não, a operadora deverá informar ao beneficiário, detalhadamente, em linguagem clara e adequada, o motivo da negativa de autorização do procedimento, indicando a cláusula contratual ou o dispositivo legal que a justifique (BRASIL, 2016, Grifo Nosso).
Por fim, devemos considerar as observações e comentários do mestre Genival Veloso de França, médico e bacharel em Direito, em sua obra Comentários ao Código de Ética Médica, 7ª edição, 2019. Da análise do artigo 52, destacamos:
O médico não deve, mesmo quando investido de função de chefia ou de auditor, alterar a prescrição ou o tratamento de paciente de outro colega, a não ser em situações em que exista a evidência de dano ao assistido e, mesmo assim, deve comunicar a ocorrência ao médico responsável. Desse jeito, o médico não deve interferir açodadamente nas atividades profissionais de outro colega, mesmo que hierarquicamente esteja acima dele, ou em funções que lhe permitam uma fiscalização, salvo em circunstâncias de pleno e irrefutável interesse do paciente. (FRANÇA, 2019, Grifo Nosso)
Sobre o artigo 97, assinala o mestre:
A análise do auditor sobre o prontuário como o descumprimento da prescrição, observações sobre exames solicitados, críticas às técnicas cirúrgicas realizadas, às dietas especiais, ao internamento e à alta, e principalmente de procedimentos propedêuticos e terapêuticos são interferências descabidas e afrontosas à dignidade profissional e à autonomia técnica e científica de cada médico. Ainda mais quando se sabe que o auditor nem sempre é o profissional adequado à especialidade aferida. A mudança de um procedimento terapêutico prescrito ou de diagnóstico já feito ou solicitado pode ocorrer em situações de urgência, emergência ou iminente perigo de vida do paciente, sendo comunicada, por escrito, ao médico assistente. (FRANÇA, 2019, Grifo Nosso)
Em relação ao artigo 98 ressalta o autor que “O atributo mais considerável de quem avalia ou fiscaliza é a isenção. Por isso, o perito e o médico auditor têm de comportar-se dentro de uma linha de imparcialidade que justifique a credibilidade de suas atribuições” (FRANÇA, 2019). Ressalta um conjunto de regras, chamado de lex artis, quais sejam: deveres de informação, deveres de atualização profissional, deveres de abstenção de abusos e deveres de vigilância, de cuidados e de atenção. Para o atual parecer nos interessa, particularmente, os deveres de atualização profissional:
Para o pleno e ideal exercício da atividade de auditoria e de perícias médicas e médico-legais não se exige do facultativo apenas uma habilitação legal. Há também de se requerer deste médico um aprimoramento sempre continuado, adquirido através de conhecimentos recentes da profissão, no que se refere às técnicas dos exames e dos meios modernos de diagnóstico, seja nas publicações especializadas, nos congressos, cursos de especialização ou estágios em centros e instituições de referência. (FRANÇA, 2019, Grifo Nosso)
DA CONCLUSÃO
Face a todo exposto, fica clara a responsabilidade do auditor da operadora de saúde, seja ela empresa de Seguro Saúde, de Medicina de Grupo, de Auto-Gestão ou Cooperativa de Trabalho Médico, perante o Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição. Essa responsabilidade está explicitada nos artigos 52, 97 e 98 do Código de Ética Médica e nas várias resoluções do CFM sobre o assunto. Ressalto que toda operadora prestadora de serviços de assistência à saúde deverá, obrigatoriamente, estar registrada no Conselho Regional de Medicina. Sendo assim, tanto o auditor como o diretor técnico estão sujeitos às penalidades decorrentes do descumprimento do Código de Ética Médica.
Esse é o parecer, S.M.J.
Rio de Janeiro, 4 de janeiro de 2021
BENJAMIN BAPTISTA DE ALMEIDA
Conselheiro Relator
Parecer Aprovado na 287ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros do CREMERJ, realizada em 14 de janeiro de 2021.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Agência nacional de Saúde. Resolução Normativa nº 395, de 14 de janeiro de 2016. Diário Oficial da União: seção I, Brasília, DF, p. 27, 15 de jan. de 2016. Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/21158896 Acesso em: 12 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA. Parecer CFM nº 11 de 26 de fev. de 2016. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/BR/2016/11 Acesso em: 12 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA. Parecer CFM nº 16 de 17 de abril de 2015. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/BR/2015/16 Acesso em: 12 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA Resolução CFM nº 1.401 de 11 de novembro de 1993. Diário Oficial da União: seção I, Brasília, DF, p. 17.802, 24 de Nov. de 1993. Disponível em: D.O.U. de 24/11/1993, seção I, pág.17.802; Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/1993/1401 Acesso em: 12 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 1.642 de 7 de agosto 2002. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2002/1642 Acesso em: 12 jan. 2021.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 2217, de 27 de set. de 2018. Dispõe sobre o Código de Ética Médica. Diário Oficial da União: seção I, Brasília, DF, p. 179. 27 de set.. de 2018. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2018/2217 Acesso em: 12 jan. 2021.
FRANÇA, Genival Veloso de. Comentários ao Código de Ética Médica. 7ª Ed. Rio de Janeiro:Guanabara Koogan, 2019, p. 179, 248-251;
Não existem anexos para esta legislação.
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