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PARECER CREMERJ nº 03/2020

PROCESSO PARECER CONSULTA Nº 20/2019

 

 

 

INTERESSADO: T.G.M. (Protocolo CREMERJ nº 10320089/2019)

ASSUNTO: Entrega de projéteis de arma de fogo, retirados durante cirurgia, à Autoridade Policial.

RELATOR: Cons.º André Luís dos Santos Medeiros

 

EMENTA: A entrega de projétil de arma fogo, retirado do corpo de um paciente durante procedimento cirúrgico, à Autoridade Policial, é sempre obrigatória. Entretanto, as informações sobre o fato ocorrido deverão ser consignadas apenas no prontuário médico, de modo a resguardar o sigilo profissional. O encaminhamento do projétil de arma de fogo caberá à administração das unidades de saúde situadas no Estado do Rio de Janeiro, públicas ou privadas, estabelecer como será feito esse encaminhamento, por força da Lei Estadual nº 8398, de 20 de maio de 2019.

 

 

DA CONSULTA

 

Trata-se de consulta realizada pelo T.G.M. sobre a obrigatoriedade da entrega de projétil de arma de fogo retirado de paciente após procedimento cirúrgico.

DO PARECER 

 

Em infrações que deixam vestígios, é indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado, por força do artigo 158 do Código de Processo Penal (CPP). A coleta desses vestígios deverá ser realizada, preferencialmente, por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames complementares (artigo 158-C do CPP).

Entretanto, frequentemente, os médicos que atendem às vítimas de agressão por arma de fogo encontram vestígios dessa agressão: o orifício de entrada do projétil de arma de fogo (PAF), com todas as suas características, e o PAF em si, no interior do corpo do paciente. Entre a preservação da vida do paciente e a manutenção dos vestígios intactos para perícia criminal, obviamente, privilegia-se àquela. Neste caso, deve o médico anotar o mais minuciosamente possível as características das lesões encontradas no paciente, tais como a localização e o formato, dentre outras, de modo a permitir um eventual exame de corpo de delito indireto com base nas informações médicas consignadas. Essa obrigação decorre do artigo nº 87 do Código de Ética Médica e da Resolução CFM nº 1.638/2002.

No Estado do Rio de Janeiro, encontra-se em vigor a Lei Estadual nº 8398, de 20 de maio de 2019, que estabelece o procedimento de destinação de projéteis e outros objetos perfurantes extraídos de vítimas de ato violento nas unidades públicas e privadas de saúde, na forma que menciona. Em seu artigo 2o, ela estabelece que as unidades públicas e privadas de saúde providenciarão o encaminhamento direto à Delegacia Policial da circunscrição dos projéteis e de outros objetos perfurantes extraídos de vítimas de ato de violência, para a instrução dos respectivos procedimentos investigatórios. A Lei não determina ser obrigação do médico fazer tal encaminhamento, e nem poderia, uma vez que não cabe à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ) legislar sobre o exercício da Medicina. Entretanto, pode legislar sobre o funcionamento das unidades de saúde situadas no Estado do Rio de Janeiro, que é o que faz.

A dúvida seria sobre se haveria quebra do sigilo profissional quando um médico entregasse um PAF para ser encaminhado à Autoridade Policial, tendo em vista que, muitas vezes, a vítima do PAF poderia ser alguém que cometeu algum delito.

O Código de Ética Médica (CEM), em seu artigo nº 73 veda ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. Por sua vez, o inciso II do artigo nº 66 da Lei das Contravenções (LCP) tipifica como contravenção penal deixar de comunicar à autoridade competente, no caso, a Autoridade Policial, crime de ação pública, de que teve conhecimento no exercício da medicina, desde que a ação penal não dependa de representação e a comunicação não exponha o cliente a procedimento criminal.

Em relação à comunicação ou não do fato à Autoridade Policial, tudo depende do fato em si, já que alguém vítima de PAF pode ter sido vítima de crime, suicídio/tentativa de suicídio ou acidente. Não cabe ao médico, em juízo de cognição sumária, dizer o que ocorreu. Dessa forma, deve o médico, simplesmente, consignar as informações obtidas no prontuário médico e encaminhar o PAF à Administração da Unidade de Saúde. Tal conduta não configura jamais quebra do sigilo profissional, pois se trata de simples encaminhamento de um objeto, sem revelação do fato ocorrido.

Ainda que se entenda que o encaminhamento do PAF possa dar ensejo a uma investigação que pode culminar com um procedimento criminal contra o cliente, não é função do médico tomar medidas para acobertar o fato. Tanto que o médico é obrigado a consignar todas as informações no prontuário médico, ainda que elas possam vir a ser utilizadas contra o paciente no futuro.

No mesmo sentido se posiciona o CRMMG, no Parecer Nº 2.832-180/2001:

 

Uma situação especial é a extração de projéteis de arma de fogo do corpo de um paciente. Os projéteis são importantes para a avaliação pericial específica, balística, não podendo seguir outro destino que não o seu encaminhamento à Autoridade Policial (Delegado de Polícia) para as providências cabíveis. Encaminha-se o mesmo, citando o nome do paciente e a região de onde o mesmo foi retirado. As outras informações deverão constar apenas do prontuário.

 

Esse foi, também, o posicionamento da Assessoria Jurídica do CREMERJ, que opinou no sentido de que o encaminhamento do PAF configura dever legal, uma das exceções que permitiriam eventual quebra do sigilo profissional.

Assim, entendemos que, uma vez que tenha sido retirado um PAF de um paciente, este deve ser encaminhado à Autoridade Policial, tendo em vista se tratar de objeto de interesse médico-legal, sendo função do Estado apurar o fato ocorrido. Todas as informações sobre o fato em si deverão ser consignadas apenas no prontuário médico.

No Estado do Rio de Janeiro, a Lei Estadual nº 8398, de 20 de maio de 2019 determina que as unidades públicas e privadas de saúde providenciarão o encaminhamento direto à Delegacia Policial da circunscrição dos projéteis e de outros objetos perfurantes extraídos de vítimas de ato de violência, para a instrução dos respectivos procedimentos investigatórios. Dessa forma, caberá à administração dessas unidades estabelecer um protocolo de encaminhamento desses objetos.

 

CONCLUSÃO

 

 

A entrega de projétil de arma fogo, retirado do corpo de um paciente durante procedimento cirúrgico, à Autoridade Policial, é sempre obrigatória. Entretanto, as informações sobre o fato ocorrido deverão ser consignadas apenas no prontuário médico, de modo a resguardar o sigilo profissional. Cabe à administração das unidades de saúde situadas no Estado do Rio de Janeiro, públicas ou privadas, estabelecer como será feito esse encaminhamento, por força da Lei Estadual nº 8.398, de 20 de maio de 2019.

 

Este é o Parecer, S.M.J.

 

                                                                                                            Rio de Janeiro, 03 de março de 2020.

 

 

 André Luís dos Santos Medeiros

Conselheiro Relator

 

 

Parecer Aprovado na 195ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros do CREMERJ, realizada em 03 de março de 2020.

 

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Decreto Lei nº 3.689 de 3 de outubro de 1941.  Código de Processo Penal. Diário Oficial da União: 11 de dez. de 1940.  Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em 02 mar. 2020

 

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 1.638, de 15 de dezembro de 2010. Diário Oficial da União: Seção I, Brasília, DF, 09 de ago. 2002. Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2002/1638. Acesso em 02 mar. 2020.

 

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM nº 2.217, de 27 de setembro de 2018. Aprova o Código de Ética Médica. Diário Oficial da União: Seção I, p. 179, Brasília, DF, 01 nov. 2011. Disponível em:  https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2018/2217. Acesso em 02 mar. 2020.

 

CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE MINAS GERAIS.  Parecer nº 2.832-180 de 02 de nov. 2001.

 

RIO DE JANEIRO (Estado). Lei nº 8.398 de 20 mai. 2019. Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro: Rio de Janeiro, RJ, 21 de mai. 2019.  Disponível em: http://alerjln1.alerj.rj.gov.br/contlei.nsf/364c23c31113163583257ddc0059662b/fcbad926a6c87c3b83258404005f97d8?OpenDocument. Acesso em 02 mar. 2020.

 

 

 


Não existem anexos para esta legislação.

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