
PARECER CREMERJ Nº 02/2019
PROCESSO PARECER CONSULTA 04/2017
INTERESSADOS: Dr. A.P (Protocolo CREMERJ nº 10273670/2017)
Dra. C.B.P.C. (Protocolo CREMERJ 10288636/2018)
Sr. W.M.C. (Protocolo CREMERJ 10300431/2018)
ASSUNTO: Exames ginecológico, obstétrico e de imagem com a presença de acompanhante e/ou profissional de saúde.
RELATOR: Consº Walter Palis Ventura
EMENTA: A presença de acompanhante durante exame ginecológico e de imagem em mulheres gestantes já encontra amparo legal, bem como nos casos de atendimento a menores de idade, idosos e pessoas com deficiências, respectivamente, no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Estatuto do Idoso e no Estatuto da Pessoa com Deficiência. É direito do médico de acordo com o Código de Ética Médica, recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a sua saúde ou a do paciente devendo, nesse caso, comunicar imediatamente sua decisão à Comissão de Ética Médica e ao Conselho Regional de Medicina.
DA CONSULTA
1 - Protocolo CREMERJ nº 10273670, de 21/08/2017
A consulta realizada pelo Dr. A.P. trata de questionamento quanto ao atendimento ginecológico sem a presença de auxiliar. Alega, na justificativa, que médicos da atenção básica estão sendo coagidos a realizar exames ginecológicos (preventivos, dentre outros) sem a presença de auxiliar ou técnicos de enfermagem e que tal fato gera atendimento isolado, expondo-os a falsas denúncias de abusos sexuais.
2 - Protocolo CREMERJ nº 10288636 de 29/03/2018
A consulta da Dra. C.B.P.C. trata de assunto similar e também reporta à realização de consulta de ginecologia sem a presença de técnica de enfermagem. Solicita informações sobre a norma que determina a obrigação de permanência de um técnico de enfermagem ou outro profissional de saúde durante o atendimento ambulatorial e, neste caso, qual seria a recomendação. Pergunta, ainda, quais as consequências legais pelo não cumprimento dessa norma em relação ao profissional médico e também para a instituição que o submete a esta situação.
Alega que, como cirurgiã oncológica e pesquisadora do INCA, cumpre parte da carga horária na seção de ginecologia oncológica, onde os cirurgiões do serviço vêm sendo obrigados a atender consultas ambulatoriais de ginecologia sem a presença de um técnica de enfermagem na sala; que o motivo aventado é de que são poucas as técnicas de enfermagem e que precisam atuar em mais de uma sala simultaneamente, deixando os médicos à sós com as pacientes por um longo período.
Informa que foram apresentadas queixas à chefia direta de enfermagem e encaminhadas à direção da unidade. Acrescenta que essa sobrecarga de trabalho das técnicas de enfermagem pode levar a erros graves com prejuízo aos pacientes.
3 - Protocolo CREMERJ 10300431, de 25/10/2018
O questionamento do Sr. W.M.C. refere-se à execução de exame de Ultrassonografia Transvaginal e Mamografia com a presença do marido no evento; em havendo proibição por parte da unidade de saúde, qual seria a providência a ser tomada e pergunta, ainda, em quais tipos de exames pode ser proibida a presença de acompanhantes.
DO PARECER
É sabido que os atendimentos em ginecologia e obstetrícia e mais recentemente em alguns exames de imagem permeiam a intimidade feminina e ultrapassam os limites físicos, abrangendo também aspectos psicossociais.
É da máxima importância que este atendimento transcorra dentro de preceitos legais e éticos respeitando-se a autonomia, a beneficência, a não maleficência e a justiça, pilares da bioética, não podendo haver negligência à privacidade, necessária para a adequada interação médico/ paciente.
Em várias áreas de atuação da prática médica a presença de familiar e/ou acompanhante de livre escolha da usuária traz benefícios a ambos, profissional de saúde e clientela. Também para o médico, a presença de auxiliar da área de saúde durante a consulta traz benefícios técnicos e, não menos importante, o protege sob os aspectos éticos e legais.
Especificamente em relação a exames radiológicos, o Colégio Brasileiro de Radiologia recomenda que o médico se faça acompanhar de auxiliar quando no manuseio de partes íntimas durante a realização de mamografias e ultrassonografias transvaginais, por exemplo. No entanto, esta recomendação é pouco esclarecedora quanto ao que fazer na ausência do serviço de enfermagem.
Com referência às normas legais que garantem o direto a acompanhante, na assistência à saúde, para a gestante, temos a Lei Federal nº 11.108/2005:
Art. 19-J. Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde - SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.
No atendimento a crianças e adolescentes, o Estatuto da Criança e do Adolescente, aprovado pela Lei Federal nº 8.069/1990, diz:
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde, inclusive as unidades neonatais, de terapia intensiva e de cuidados intermediários, deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016)
No atendimento aos idosos, o Estatuto do Idoso, aprovado pela Lei Federal nº 10.741, em 1º outubro de 2003, diz:
Art. 16. Ao idoso internado ou em observação é assegurado o direito a acompanhante, devendo o órgão de saúde proporcionar as condições adequadas para a sua permanência em tempo integral, segundo o critério médico.
Parágrafo único. Caberá ao profissional de saúde responsável pelo tratamento conceder autorização para o acompanhamento do idoso ou, no caso de impossibilidade, justificá-la por escrito.
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), aprovado pela Lei Federal nº 13.146, de 06 de julho de 2015, garante:
Art. 22. À pessoa com deficiência internada ou em observação é assegurado o direito a acompanhante ou a atendente pessoal, devendo o órgão ou a instituição de saúde proporcionar condições adequadas para sua permanência em tempo integral.
§ 1o Na impossibilidade de permanência do acompanhante ou do atendente pessoal junto à pessoa com deficiência, cabe ao profissional de saúde responsável pelo tratamento justificá-la por escrito.
Nos demais casos e por tratar-se de tema relevante, várias recomendações de Conselhos Regionais de Medicina e do CFM abordam, ainda que tangencialmente, a matéria supracitada, cujos normativos citamos a seguir:
1 - Parecer CFM nº 07/2007:
EMENTA: A presença de acompanhante para a mulher em trabalho de parto, parto e pós-parto, embora prevista em lei, deve obedecer aos princípios da privacidade, sem os quais inviabiliza-se o cumprimento da lei.
2 - Recomendação do CREMESP nº 01/1988:
01. Que os médicos ao atenderem pacientes submetendo-as a exames ginecológicos preferencialmente pratiquem os referidos atos médicos na presença de auxiliar e/ou de pessoa acompanhante da paciente.
02. Que expliquem as pacientes previamente e de forma detalhada, os procedimentos que irão realizar durante o exame ginecológico.
3 - Parecer CREMEB nº 03/2009:
Ementa: É recomendável que o médico realize exame de mama ou ginecológico na presença de auxiliar da área de saúde/ familiar ou acompanhante. Compete ao gestor da Unidade de Saúde compor seu quadro de pessoal para dar atendimento ao que se propõe. (...)
4 - Parecer CRM/PR nº 1.207/1999:
Versa sobre procedimento médico nos exames de conjunção carnal e ato libidinoso. Refere que:
No exame propriamente dito é imprescindível a presença de uma enfermeira e caso a paciente entenda necessária também a presença de um familiar indicado pela examinada, sendo necessário seu consentimento.
5 - Parecer CRM/MS nº 06/2015:
É recomendável que os exames tocoginecológicos realizados por médicos (as) ou sejam na presença de enfermeira e/ou pessoa de confiança da paciente. Quanto a obrigatoriedade do pessoal de enfermagem nesses exames, compete aos gestores manusear seu pessoal para atender essa condição. É direito do médico de acordo com o inciso IV capítulo II do Código de Ética Médica recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a própria saúde ou a do paciente bem como as dos demais profissionais. Nesse caso comunicará imediatamente sua decisão à Comissão de Ética e ao Conselho Regional de Medicina.
Cabe ressaltar que nos Protocolos da Atenção Básica da Saúde das Mulheres, do Ministério da Saúde- 2016, não há qualquer menção quanto a presença de acompanhante e/ou profissional de saúde auxiliando no exame ginecológico.
CONCLUSÃO
Não há questionamento em relação ao direito à presença de acompanhante nos casos de atendimentos a menores, gestantes, idosos e deficientes, tanto no serviço público quanto no privado, tendo em vista a legislação já contemplar tais casos. Nas demais situações, o acompanhante poderá se colocar junto à paciente, caso haja desejo manifesto por parte dela, e que esta presença não possa inferir risco ou prejuízo à consulta. É necessário, para isto, a garantia plena da privacidade, condição precípua para a adequada relação médico-paciente.
Nos serviços de saúde que não permitem, de forma justificada, a presença do acompanhante, isto deve ser explicitado previamente, de forma clara, preferencialmente quando da marcação da consulta e/ou exame, ficando a critério da mulher decidir por outro prestador de serviço.
No tocante à presença de profissional de saúde auxiliando durante a consulta ginecológica e/ou exames de imagem, esta deve ser a RECOMENDAÇÃO, tendo em vista a segurança de ambos os envolvidos no atendimento, assim como permitindo a melhor qualidade desta.
É direito do médico, de acordo com o Código de Ética Médica, Capítulo II, inciso IV, recusar-se a exercer sua profissão em instituição pública ou privada onde as condições de trabalho não sejam dignas ou possam prejudicar a própria saúde ou a do paciente, bem como as dos demais profissionais. Nesse caso, comunicará imediatamente sua decisão à Comissão de Ética Médica e ao Conselho Regional de Medicina.
Tal matéria poderia ser reportada ao CFM para que, de forma conclusiva, emita normativo uniforme e prevalente em todo território nacional.
Este é o Parecer, S.M.J.
Rio de Janeiro, 26 de março de 2019.
WALTER PALIS VENTURA
Conselheiro Relator
Parecer Aprovado na 76ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros do CREMERJ, realizada em 26/03/2019.
REFERÊNCIAS:
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Código de Ética Médica. , 2018. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
__________. Parecer CFM n. 07. DF, 2007. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
__________. Parecer CREMEB n. 03. , 2009. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
___________ Parecer CRMPR n. 1.207. Df, 1999. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
____________ Parecer CRMMS n. 06. DF, 2015. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO. Recomendação CREMESP n. 01. SP, 1988. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 11.108, de 07 de abril de 2005. Altera a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para garantir às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Publicado no Diário Oficial da União, Brasileira, DF, 8 abr. 2005. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 jul. 1990 e retificado em 27 set. 1990. Disponível em: . Acesso em 10 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 out. 2003. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
BRASIL. Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 jul. 2015. Disponível em: . Acesso em: 10 abr. 2019.
BRASIL. Ministério da Saude. Protocolos da Atenção Básica. Saúde das Mulheres, Brasília, DF, 2016. Disponível em: . Acesso em 10 abr. 2019.
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