
NOTA TÉCNICA CREMERJ Nº 01/2024
(Câmara Técnica de Cardiologia)
(Aprovada na 77ª Sessão Plenária do Corpo de Conselheiros realizada em 29/10/2024)
ASSUNTO: Trata do uso de medicamento trombolítico, bem como de protocolo para o tratamento do infarto do miocárdio em plataforma de petróleo, a partir do Parecer CREMERJ nº 34/2023 a fim de dar ampla divulgação sobre o assunto.
Após análise do protocolo em epígrafe, o presente parecer, elaborado pela Câmara Técnica de Cardiologia do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CREMERJ), tem como objeto analisar questões acerca do tratamento do Infarto do Miocárdio em plataformas de petróleo. Ressalta-se sua importância com casos descritos na mídia de infarto com desfecho fatal, que não receberam o tratamento inicial com trombólise.
Esse parecer visa elucidar os profissionais envolvidos no tratamento do Infarto do Miocárdio, assim como os agentes que atuam na área médica, incluindo entidades médicas privadas sem fins lucrativos, o Ministério da Saúde e as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, os conselhos de fiscalização profissional, e os prestadores e operadoras de planos de saúde.
CONSIDERANDO:
1- A NR 37 normatiza a SEGURANÇA E SAÚDE EM PLATAFORMAS DE PETRÓLEO - Portaria Ministério do Trabalho n.º 1.186, de 20 de dezembro de 2018 - e determina que a plataforma habitada deve possuir profissional de saúde registrado no respectivo conselho, embarcado para prestar assistência à saúde e atendimentos de primeiros socorros, conforme as Normas da Autoridade Marítima para Embarcações Empregadas na Navegação de Mar Aberto, da Diretoria de Portos e Costas - DPC da Marinha do Brasil. Determina, ainda, que deve ser dotada de enfermaria que atenda ao descrito no Capítulo 9 da NORMAM-01/DPC e na NR-32 (Segurança e Saúde no Trabalho em Serviços de Saúde), naquilo a que couber; e:
[...] deve disponibilizar sistema de telemedicina entre o profissional de saúde a bordo e os médicos especialistas em terra, a qualquer hora do dia ou da noite, operado por trabalhador capacitado, conforme resoluções do Conselho Federal de Medicina e demais legislações pertinentes.
Os profissionais de saúde de nível superior devem ter os treinamentos avançados em suporte cardiológico e trauma pré-hospitalar, certificados por instituições especializadas, obedecendo às suas respectivas validades.
Os equipamentos, materiais e medicamentos para prestar a assistência à saúde e o atendimento de primeiros socorros aos trabalhadores a bordo devem ser definidos e descritos pelo médico responsável pelo PCMSO da plataforma, elaborado pela operadora da instalação. [...] (Brasil, 2018)
2 - A Portaria do Ministério do Trabalho e Previdência Nº 90 de 18 de janeiro de 2022, aprova a nova redação da Norma Regulamentadora nº 37 - Segurança e Saúde em plataformas de petróleo. Determina que a partir de trinta e um até duzentos e cinquenta trabalhadores a bordo, o profissional de saúde deve ser um técnico de enfermagem, sob a supervisão de enfermeiro, um enfermeiro ou um médico; disponibilizar sistema de telemedicina entre o profissional de saúde a bordo e os médicos especialistas em terra, a qualquer hora do dia ou da noite, operado por trabalhador capacitado, conforme resoluções do Conselho Federal de Medicina e demais legislações pertinentes; os equipamentos, materiais e medicamentos para prestar a assistência à saúde e o atendimento de primeiros socorros aos trabalhadores a bordo devem ser definidos e descritos pelo médico responsável pelo PCMSO da plataforma, elaborado pela operadora da instalação.
[...]A operadora da instalação e as empresas prestadoras de serviços devem adotar medidas que visem à promoção, à proteção, à recuperação e à prevenção de agravos à saúde de todos os seus trabalhadores a bordo, de maneira a compreender ações em terra e a bordo e contemplar:
serviços gratuitos de assistência à saúde a bordo e em terra pela operadora da instalação ou por empresas especializadas na prestação desses serviços, que sejam decorrentes de acidentes ou doenças ocorridas no trabalho, com os empregados próprios e terceirizados;
O desembarque e remoção do trabalhador para unidade de saúde em terra, no caso de necessidade de cuidados médicos complementares, devendo atender aos seguintes requisitos: o tipo de aeronave a ser utilizada para transportar o trabalhador deve obedecer ao critério do médico regulador, designado pela concessionária ou operadora da instalação; no caso de atendimento emergencial, com o resgate realizado por aeronave do tipo Evacuação Aeromédica - EVAM, a aeronave e a tripulação devem estar prontas para decolar em até trinta minutos após o seu acionamento pelo médico regulador, sendo que tempos superiores a trinta minutos devem ser justificados pela operadora da instalação; entretanto, o prazo para a decolagem não pode exceder a quarenta e cinco minutos. [...] (Brasil, 2022)
3 - As doenças do aparelho circulatório são as principais causas de óbito no mundo, e as doenças isquêmicas do coração representam a maioria dos casos neste grupo. As síndromes coronarianas agudas, por sua vez, representam períodos de manifestação clínica da doença aterosclerótica coronariana com as maiores taxas de mortalidade e impacto em qualidade de vida da população, representando uma janela de oportunidade fundamental para que o médico possa oferecer atendimento correto e sistematizado, visando reduzir a morbimortalidade deste grupo de doenças. É importante considerar, na tomada de decisão, o protocolo para o atendimento de Infarto do Miocárdio descrito na Cartilha Para o Atendimento de Pacientes Com Síndrome Coronariana Aguda elaborada pela Câmara Técnica de Cardiologia juntamente com a SOCERJ e lançada em 29 de abril de 2024, das quais destacamos as seguintes informações correlatas:
4 - As Plataformas de Petróleo devem possuir eletrocardiograma, monitor para parâmetros cardiovasculares com oximetria de pulso, desfibrilador automático com marca-passo externo, material completo de assistência ventilatória (oxigênio, tubos, laringoscópio, kit de traqueostomia, ambu e dispositivos de ventilação supra-glóticos), e medicamentos de emergência e de atendimento ambulatorial, que incluem trombolítico (tenecteplase), antiarrítmicos, anticoagulantes e antiagregantes.
5 - Recomenda-se a realização do primeiro eletrocardiograma em até 10 minutos da chegada do paciente na enfermaria, e o mais próximo possível do início da dor de origem isquêmica descrita abaixo:
Características da dor de origem isquêmica • Desconforto ou dor torácica. • Característica de opressão, constrição, queimação, facada. • Habitualmente de intensidade moderada a intensa. • Localização retroesternal/torácica (não restrita). • Manifestações em repouso (frequentemente) ou desencadeadas por emoções ou esforços físicos. • Início agudo com acentuação rápida e progressiva.
-
- Muitas vezes com irradiação para membros superiores (E>D), dorso, pescoço, mandíbula, dorso, abdome (epigástrio). • Duração prolongada (classicamente mais que 15 min/30 min). • Habitualmente sem alívio com nitratos ou repouso. • Sudorese, tonteira, náusea, vômito, dispneia, fadiga são manifestações frequentemente associadas. • Possível em muitas ocasiões a identificação de fatores de risco para doença coronariana ou eventos cardiovasculares prévios.
6 - Recomenda-se o uso de Tenecteplase em bôlus, infusão entre 5 a 10 segundos e administrado nas apresentações de 40 ou 50mg, conforme tabela de peso abaixo e recomendação da Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia.
Tabela de peso: 30mg se < 60 kg, 35mg se 60-70kg, 40mg de 70-80kg, 45mg se 80-90kg e 50mg se ≥ 90kg.
Indicações para o uso de trombolíticos:
- Sintomas atuais sugestivos de isquemia miocárdica.
- Presença de Supra ST (deve possuir mais que 1mm em relação ao ponto J -final do QRS) em duas ou mais derivações anatomicamente contíguas OU Bloqueio de Ramo novo ou presumivelmente novo.
Contraindicações absolutas ao trombolítico: • Hemorragia intracraniana prévia (em qualquer momento da vida). • Conhecida lesão vascular cerebral estrutural (malformação arteriovenosa). • Conhecida neoplasia intracraniana (primária ou metastática). • AVE isquêmico nos últimos 3 meses. • Suspeita consistente de dissecção aórtica. • Sangramento ativo ou diátese hemorrágica (excluída menstruação).
Critérios de reperfusão: • Redução do supra ST (principal). • Diminuição intensidade da dor. •Pico precoce de enzimas cardíacas. • Arritmias de reperfusão - Ritmo idioventricular acelerado.
7 - Em caso de dúvida diagnóstica e/ou sobre a utilização do trombolítico, recomendamos o suporte online ou via telemedicina com médico especialista disponível, conforme determina a Portaria MTP Nº 90 DE 18/01/2022 (sistema de telemedicina entre o profissional de saúde a bordo e os médicos especialistas em terra, a qualquer hora do dia ou da noite, operado por trabalhador capacitado, conforme resoluções do Conselho Federal de Medicina e demais legislações pertinentes).
8 - Iniciar tratamento antitrombótico: •AAS 200mg mastigáveis. •Clopidogrel: Se idade ≥ 75 anos: 75mg via oral. •Clopidogrel: Se idade < 75 anos: 300mg via oral. • Enoxaparina: Se idade ≥ 75 anos: 0,75mg/kg 12/12h (max 75mg por dose nas primeiras duas doses) subcutânea. • Enoxaparina: Se idade < 75 anos: 30mg bolus intravenoso + 1mg/kg 12/12h (máx 100mg por dose nas primeiras duas doses) subcutânea.
9 - Iniciar tratamento adjuvante •Oxigênio: administrar somente nos pacientes com hipoxemia (SpO2< 90%). • Betabloqueadores: nos pacientes com Infarto Agudo do Miocárdio com Supra ST encaminhados para hemodinâmica, administrar metoprolol (5mg) por via intravenosa (infundir em 2 minutos); se necessário, repetir a cada 5 minutos, até a dose máxima de 15mg. A administração de betabloqueadores em todos os outros casos confirmados de Síndrome Coronariana Aguda deve ser considerada, preferencialmente por via oral e dentro das primeiras 24h. As contraindicações principais para o início nesse contexto são: sinais de insuficiência cardíaca, evidência de baixo débito, alto risco para choque cardiogênico (idade superior a 70 anos, frequência cardíaca > 110bpm/min ou pressão sistólica < 120mmHg), hiper-reatividade brônquica, uso de cocaína, bradicardia. • Nitratos: visam controle da dor e hipertensão. Administrar dinitrato de isossorbida 5mg via sublingual, a cada 5 minutos, até a dose máxima de 15mg. Se houver persistência da dor após três doses, iniciar nitroglicerina intravenosa. As contraindicações principais são: PAS < 100mmHg, infarto de ventrículo direito, uso de sildenafila nas últimas 24h, uso de tadalafila nas últimas 48h, estenose aórtica grave conhecida. • Morfina: administrar apenas para casos de dor refratária à nitratos e betabloqueadores. Dose inicial: 2 a 4mg via intravenosa, a cada 5 minutos, até a dose máxima de 25mg. • Inibidores da ECA / BRA: iniciar para os pacientes hipertensos, diabéticos, com insuficiência cardíaca e/ou disfunção ventricular esquerda (fração de ejeção ventrículo esquerdo ≤ 40%). O uso nos pacientes, independentemente da presença das condições anteriores, deve ser considerado. • Estatinas: usar estatinas de alta potência precocemente, independente dos níveis iniciais de LDL colesterol
10 - Dentro do contexto da estratégia fármaco-invasiva, após a utilização do trombolítico, recomendamos a transferência do paciente para hospital com serviço de cardiologia intervencionista. Após o procedimento de Trombólise, o paciente deverá ser transferido a uma Unidade para ser submetido ao Cateterismo Cardíaco. O médico da Plataforma, responsável pelo atendimento, deve inserir o paciente no SER, com exames de ECG, Hemograma e a referência de alergia ou não ao iodo. A Central analisa o caso e faz o referenciamento para a Unidade especializada no mesmo dia. O transporte do paciente deve ser solicitado pela Plataforma à TIH (SAMU) correspondente.
11 - Situações que demandam cateterismo de urgência nesse grupo: ► Instabilidade hemodinâmica ou choque cardiogênico. ► Dor refratária ao tratamento medicamentoso. ► Arritmias malignas ou parada cardiorrespiratória. ► Complicações mecânicas do infarto. ► Insuficiência Cardíaca Aguda.
- Alterações recorrentes do segmento ST-T com elevação intermitente do segmento ST.
Conclusão:
A Câmara Técnica de Cardiologia do CREMERJ considera de fundamental importância a abordagem sistematizada do Infarto do Miocárdio, incluído o uso de trombólise, conforme o protocolo acima descrito em qualquer cenário de atendimento, incluindo as plataformas de petróleo.
Rio de Janeiro, 29 de outubro de 2024.
Dr. Roberto de Castro Meirelles de Almeida
Responsável pela Câmara Técnica de Cardiologia do CREMERJ
Dra. Glaucia Maria Moraes de Oliveira
Relatora
Dra. Ana cristina Figueiredo
Relatora
Membros Presentes:
Ana Cristina Figueiredo
Glaucia Maria Moraes de Oliveira
Gustavo Gouvêa
Bruno Heringer
Marcelo Lamberti Marcio Montenegro
Antônio Ribeiro Ricardo Vivacqua
Mauro Augusto dos Santos
Mara Eulália Thebit Pfeiffer
Referências:
- Cartilha Para o Atendimento de Pacientes Com Síndrome Coronariana Aguda elaborada pela Cãmara Técnica de Cardiologia juntamento com a SOCERJ e lançada em 29/04/2024 https://www.cremerj.org.br/downloads/pdf/242_cartilha_sindrome_coronariana_aguda.pdf?inline=i nline
- Piegas LS, Timerman A, Feitosa GS, Nicolau JC, Mattos LAP, Andrade MD, et al. V Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Tratamento do Infarto Agudo do Miocárdio com Supradesnível do Segmento ST. ArqBrasCardiol. 2015; 105(2):1-105. https://doi.org/10.5935/abc.20150107
- Protocolos Clínicos – Secretaria Municipal de saúde – versão 2017
- MAC: Manual de Atualização e Conduta: Síndrome Coronariana Aguda (SCA) / Aurora Felice Castro Issa...[et al.] ;coordenadores Antônio Ribeiro Pontes Neto, Olga Ferreira de Souza, Ricardo Mourilhe Rocha. -- São Paulo: PlanMark, 2015. Outros autores: Gláucia Maria Moraes de Oliveira, Luiz Maurino Abreu, Ricardo Mourilhe Rocha, Roberto Esporcatte. ISBN: 978-85- 60566-75-4
- Baruzzi ACA, Piscopo A, Moraes PIM, Ramos R, Saretta R, Cesar LAM. Infarto Agudo do Miocárdio com Supra ST – Guia Prático, 2024. Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo.
- Byrne RA, Rossello X, Coughlan JJ, Barbato E, Berry C, Chieffo A, et al. ESC Guidelines for the management ofacutecoronarysyndromes. Eur Heart J. 2023 Oct 12;44(38):3720-3826. doi: 10.1093/eurheartj/ehad191. Erratum in: Eur Heart J. 2024 Apr 1;45(13):1145.
- Lopes MACQ, Oliveira GMM, Ribeiro ALP, Pinto FJ, Rey HCV, Zimerman LI, Rochitte CE, et al. Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Telemedicina na Cardiologia – 2019. Arq. Bras. Cardiol. 2019;113(5):1006-5.
- Diretriz de Telecardiologia no Cuidado de Pacientes com Síndrome Coronariana Aguda e Outras Doenças Cardíacas- Arq. Bras. Cardiol. 104 (5 suppl1) Jun 2015 https://doi.org/10.5935/abc.20150057
Não existem anexos para esta Nota Técnica.
Sede: Praia de Botafogo, 228 – Botafogo – CEP: 22.250-145
Tel.: (21) 3184-7050 – Fax: (21) 3184-7120
Homepage: www.cremerj.org.br