Anoxerígenos: CREMERJ manifesta apoio à SBEM

O CREMERJ manifesta seu apoio à Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) que se declarou contrária à proibição de medicamentos para controle do apetite e saciedade.

Confira abaixo o artigo do presidente da SBEM Ricardo Meirelles publicado no jornal O Globo do dia 3 de março de 2011.

Ciência mal digerida

Ricardo Meirelles

A hipótese de que os medicamentos para controle do apetite e saciedade venham a ser retirados do mercado é preocupante. Se isso acontecer, milhares de pacientes com obesidade serão prejudicados. Uma pessoa que, durante anos ou décadas, manteve um comportamento alimentar inadequado, tem dificuldade para mudar esses hábitos e pode necessitar de apoio farmacológico para iniciar essa mudança.

Recentemente a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, juntamente com as sociedades para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica, de Nutrologia, de Clínica Médica e de Medicina da Família e Comunidade, convidou vinte dos seus mais competentes especialistas para a atualização da diretriz sobre tratamento farmacológico da obesidade. Esses médicos, todos com muitos anos de experiência,  professores universitários e estudiosos do tema em questão, concluíram que os medicamentos anorexígenos são úteis para auxiliar o obeso a perder peso e que seus benefícios, quando prescritos com inteligência, superam os possíveis riscos. Surpreendentemente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), estudando o mesmo assunto, chegou a conclusões opostas, e manifesta a intenção de cancelar o registro de todos os medicamentos para obesidade de ação central.

Para chegar a isso, não ouviu a comunidade científica diretamente envolvida no tratamento da obesidade e pretende que isso seja feito em uma audiência pública que, certamente, não é o fórum adequado para a discussão de temas científicos.

Os anorexígenos são objeto de controvérsias há longo tempo. Os primeiros medicamentos com essa finalidade, as anfetaminas, causavam efeitos adversos e, por isso, foram retiradas do mercado. Deixaram, entretanto, uma esteira de preconceito, principalmente porque eram usadas com outras finalidades que não o tratamento da obesidade, como para impedir o sono ao estudar ou dirigir. Esse preconceito se estendeu aos seus derivados, embora mais bem tolerados e sem os seus riscos para a saúde.

A sibutramina, por exemplo, se tornou vítima de um dos maiores equívocos científicos já vistos. Foi realizada uma pesquisa para saber se ela poderia ser utilizada por pacientes com problemas cardíacos e os resultados confirmaram o que já se imaginava: os riscos, nessa população específica, superam os benefícios. O que não quer dizer que pacientes sem problemas cardiovasculares não possam se beneficiar do seu uso.

Apesar disso, sua comercialização foi proibida pela Agência Européia de Medicamentos. Um erro, a nosso ver, que não deve ser imitado. Alega-se que os anorexígenos não propiciam benefícios aos pacientes porque as perdas de peso são relativamente pequenas. É preciso entender, entretanto, que o critério de sucesso no tratamento da obesidade não é necessariamente atingir o peso ideal, embora isso fosse o desejado, mas que emagrecimentos de 5% a 10% do peso corporal já são eficazes para diminuir as conseqüências das doenças associadas à obesidade. Ninguém, em sã consciência, defende o uso indiscriminado de qualquer medicamento. Se uma substância está sendo prescrita de forma inadequada, é preciso ensinar a prescrevê-la bem. Para isso existe o Projeto Diretrizes, da Associação Médica Brasileira, do Conselho Federal de Medicina e da Agência Nacional de Saúde Suplementar, apoiado pelo Ministério da Saúde.

Utilizado com critério, o tratamento farmacológico da obesidade é uma das escassas opções de que dispomos para tratar essa doença crônica, de prevalência crescente e consequências devastadoras.

Ricardo Meirelles é endocrinologista e presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.