Aviso de Privacidade Esse site usa cookies para melhorar sua experiência de navegação. A ferramenta Google Analytics é utilizada para coletar informações estatísticas sobre visitantes, e pode compartilhar estas informações com terceiros. Ao continuar a utilizar nosso website, você concorda com nossa política de uso e privacidade. Estou de Acordo

Faculdades caça-níqueis

18/12/2012

Muito se fala sobre o grande número de processos que envolvem o erro médico no Brasil. Também é dito que o ensino na graduação de Medicina piora a cada ano, relacionado com o aumento de cursos pelo país, algo entorno de 200. Associados, os fatos têm levado parlamentares a apresentar diversas emendas à lei que cria os Conselhos de Medicina entre as quais se destaca obrigatoriedade de um exame de conhecimento e competência depois da conclusão da graduação. Apenas os aprovados seriam médicos, um modelo semelhante ao da OAB.

O Conselho Regional de São Paulo (Cremesp) é simpático à idéia e instituiu, em 2005, um exame voluntário aplicado para estudantes do Estado. Este ano, a avaliação tornou-se obrigatória. Não haverá punição aos reprovados, mas nenhum graduado terá seu registro no CRM sem ter feito a prova.

O exame da OAB, instituído nos anos 1970 e compulsório desde 1994, foi criado como solução para melhorar o ensino de Direito e frear o crescimento do número de escolas. Nas avaliações dos últimos anos, o percentual de aprovação gira em torno de 14%. O alto índice de reprovação sugere que a qualidade do ensino não melhorou. O Provão, aplicado pelo MEC entre de 1996 e 2003, mostrou que houve piora de conceito em 80% dos cursos jurídicos no período. E o total de faculdades no Brasil cresceu 67% entre 2003 e 2011, passando de 704 para 1126. Conclui-se que o exame da OAB não melhorou o nível dos formados nem impediu a criação de novas escolas.

A experiência da advocacia leva à conclusão de que um exame de tal natureza para os médicos não vai melhorar a qualidade profissional, nem inibir o aparecimento de mais faculdades. Há também a possibilidade de criação de uma indústria de cursinhos, ou ainda de um esquema de fraudadores. É criticável, também, a obrigação de avaliar o conhecimento de seis anos em uma única tarde de domingo. Nunca é demais lembrar que aos CRMs cabe fiscalizar o exercício da profissão do médico e não investir uma verba considerável para elaborar, aplicar e corrigir uma prova para os 16 mil formandos em Medicina espalhados pelo país a cada ano.

Por fim, fica no ar a pergunta: com a oficialização do exame, o que faremos com os reprovados? No Direito, o reprovado será um bacharel que tem um amplo mercado de trabalho. Pode fazer concurso, elaborar petições que serão assinadas por advogados e dar expediente em escritórios, sem inutilizar o tempo e investimento na faculdade. O que fará o bacharel em Medicina? Poderá operar alguém e pedir a um médico para assinar o boletim cirúrgico? Acabará exercendo a medicina ilegalmente? Já foi dito que o destino do reprovado deve ser o retorno à faculdade. Isto é factível? Considerando um índice de 50% de reprovação, em poucos anos teríamos que dobrar a capacidade das faculdades ou aumentar o número de cursos. Um verdadeiro tiro pela culatra.

O que tem de ser pensado, então, é a avaliação da escola e não do aluno. O certo é mensurar a capacitação do docente da faculdade, sua infraestrutura e outros tópicos que influenciam na formação. Faculdades desqualificadas devem ser fechadas. Assim será possível melhorar a formação do estudante e inibir iniciativas caça-níqueis.

Artigo do Vice-Corregedor do CREMERJ e Professor de Ortopedia da UERJ, Renato Graça, publicado nesta terça-feira, 18, no Jornal O Globo.