Clipping - Dependência das redes sociais é questão de saúde, dizem especialistas
O Globo / Sociedade
23/02/2019
O impacto da internet na qualidade de vida foi o tema do Encontros O GLOBO Saúde e Bem-Estar desta semana; para debatedores, uso deve ser consciente para evitar vício
Antes de baixar o WhatsApp, há um ano, o biólogo e
agricultor Eduardo Loureiro, de 27 anos, tinha uma relação menos constante com
seu celular, que usava apenas para ligações e resolução de problemas mais
imediatos. Morador de Penedo, no Sul do estado do Rio, ele se sentiu forçado a
se conectar mais frequentemente quando percebeu que conhecidos estavam deixando
de falar com ele, e que ficava sabendo das novidades de seu círculo de amigos
muito depois que aconteciam. — Quando vou trabalhar na roça, às vezes fico mais
de uma semana sem checar as mensagens. Gosto de internet, mas, desde que
comecei a usar o WhatsApp, percebi que fico mais ansioso, sinto que tenho de
responder logo e estar sempre disponível —afirma ele. Para Loureiro, sua
postura mais “desligada” o fez notar como o uso de internet e, principalmente,
de redes sociais pode ser prejudicial. Ele diz ter conhecidos que são vítimas
de uma “ânsia de informação” constante, o que pode atrapalhar a vida social.
Por outro lado, afirma que colegas agricultores têm usado o Instagram para
divulgar seus trabalhos, o que é um ponto positivo.
A discussão sobre os impactos da internet na qualidade de
vida foi o mote do Encontros O GLOBO Saúde e Bem-Estar, que ocorreu na
quarta-feira, no auditório do jornal, com mediação da jornalista Ana Paula
Blower. Segundo o cardiologista Cláudio Domênico, curador do evento, é preciso
ter discernimento ao utilizar a rede.
— O brasileiro é um dos campeões no tempo diário de uso de
internet. O lado bom é que ela dá acesso à informação. O ruim é que, junto
disso, vem desinformação, fake news, dependência. É preciso usar com
responsabilidade, principalmente as redes sociais —destacou Domênico.
O vício em internet é potencializado pelos algoritmos das
redes sociais, talhados para “maximizar o prazer e minimizar a dor”, como
definiu o cardiologista Flavio Alvim, um dos palestrantes do evento. Por meio
de curtidas, compartilhamentos e engajamento do público, eles mexem com
nosso “sistema de recompensa”. —A inteligência artificial
contida nos algoritmos muda comportamentos. Acredita-se que curtidas ajam em
uma parte específica do nosso cérebro que gera prazer. A grande questão é: se
podemos mudar o comportamento para vender ideias e produtos, não poderíamos
fazê-lo para vender saúde e prevenção? Sim, mas ninguém ainda descobriu como
ganhar dinheiro com isso —disse Alvim.
APLICATIVOS PARA LIMITAR TEMPO
Para o diretor de marketing Eriko Barbosa, que trabalha com
mídias sociais e marketing digital, o recado de que as redes estavam lhe
fazendo mal veio no ano passado. Com 27 anos de idade, vive conectado e
prioriza o pacote de dados em seu plano de celular, mas percebeu que começou a
ficar ansioso quando julgou não estar conseguindo “acompanhar a quantidade de
notificações”.
— Você começa a perceber que está passando do limite quando
as pessoas em um jantar, no bar ou na família reclamam sua atenção. Começa a
ficar problemático quando não percebemos o quanto estamos distantes das pessoas
que importam. Eu, que conheço a ferramenta, já me sinto afetado e consigo me
frear. Mas e as pessoas que não conseguem ter uma leitura mais aprofundada?
—questiona.
Nem tudo na internet é digno de preocupação ou
desconfiança, como ressaltou outro palestrante, Vitor Conceição, fundador do
Canal Meio. Trabalhando desde 1995 na área, ele diz que a internet possibilita
coisas incríveis. Ainda assim, ele alerta para o tempo gasto com as plataformas
on-line. —É esperado que o tempo on-line supere o tempo gasto com TV nos EUA
neste ano. A boa notícia é que as empresas estão começando a perceber que o uso
excessivo é um problema e a propor mudanças— afirmou Conceição, que citou
funções em aplicativos que contam e limitam o tempo gasto conectado.