Na Mídia - Troca e doação para garantir medicamentos
Extra / Cidade
29/07/2018
Pacientes recorrem a trocas e doações na internet para garantir medicamentos
Só a solidariedade cura. Essa frase nunca foi tão
verdadeira quanto atualmente para pacientes de doenças crônicas e que dependem
de medicamentos controlados e caros distribuídos gratuitamente pelo governo do
estado. Diante do abastecimento irregular da Rio Farmes, a farmácia do estado,
muitas dessas pessoas recorrem às dezenas de grupos de troca e doação de
remédios que existem na internet e, só assim, conseguem dar continuidade ao
tratamento.
Normalmente, o medicamento oferecido — e muitas vezes
enviado pelo correio de lugares distantes — é sobra de algum parente que morreu
ou de pessoas que concluíram a terapia e usam as redes sociais para passá-lo
adiante, sem custos, apenas com a intenção ajudar o próximo.
Não fosse dessa forma, Luma Doné Miranda, de 27 anos, não
teria como tratar a retocolite ulcerativa, doença do intestino, diagnosticada
em 2011. Ela conta que a última vez que encontrou o seu remédio, o Mesalazina
400mg, na farmácia do estado foi em março de 2016 (hoje, a Rio Farmes tem o de
500mg, o que não soluciona seu problema). Desde então, a salvação tem sido
grupos de troca e doação. Como ela toma quatro comprimidos por dia, uma caixa
que custa de R$ 140 a R$ 200 só dura uma semana.
— Acabamos criando mecanismos para lidar com a falta de
remédios. A gente nem sabe se é certo, mas faz porque é uma questão de saúde —
argumenta a moradora do Itanhangá que participa de cinco grupos no Facebook e
dois no WhatsApp.
Já a moradora de Nilópolis Laura Lee, de 35 anos, criou um
grupo no Facebook (Doação de Medicamentos-RJ) após ter sido diagnosticada como
portadora do vírus HTLV, que é transmitido sexualmente. Começou doando
medicamentos que sobravam, hoje tem seis prateleiras cheias para doação e busca
espaço maior para ampliar a ajuda aos que precisam.
A prática, no entanto, não tem aprovação do Ministério da
Saúde, que recomenda a devolução das sobras ao órgão, para análise e possível
redistribuição a outros pacientes.
‘Grupos são suporte para enfrentar
doença’
LUMA
DONÉ MIRANDA de 27 anos, portadora de retocolite ulcerativa
As doações me mantêm por um tempo, mas não garantem que vou
ter o medicamento todos os meses. No entanto, diante da falta no estado, é a
principal saída. Os grupos de troca e doação de remédios são de extrema
importância. Eu não estaria aqui conversando não fosse isso. Fora que ganhei o
que chamo de irmãos intestinais, que também formam uma rede de apoio, por
reunir pessoas que enfrentam o mesmo mal. Além de serem importantes para
facilitar a obtenção do medicamento, esses grupos são suporte para enfrentar a
doença.
CUIDADOS
NECESSÁRIOS
VALIDADE
Quem vai doar ou receber medicamentos precisa ficar atento
à data de validade do mesmo, para evitar prejuízo à saúde.
REFRIGERAÇÃO
O Ministério da Saúde adverte ainda que alguns remédios,
para terem eficácia, necessitam estar sob determinada temperatura e também
precisam de acondicionamento especial. Por isso, não recomenda a doação ou
troca.
PRIORIDADE
Como os medicamentos podem vir de diferentes fontes e com
validades distintas, os pacientes costumam utilizar primeiro os com data mais
próxima do vencimento, para evitar o desperdício.
ONDE
BUSCAR
O grupo Doações de Medicamentos-RJ aceita tanto pedidos
quanto oferta de doações pelos telefones (21) 98132-0960/ 98166-1322/
99389-6659. As entregas, sem frete, são feitas apenas na Baixada Fluminense, no
Rio de Janeiro e em cidades vizinhas. A Associação de Pessoas com Doenças
Inflamatórias Intestinais (ADII) aceita pedido de doação e oferta de remédios
pelo e-mail contato@adiirio.org.br
SEM
RESPOSTA
A Secretaria estadual de Saúde também foi procurada pelo
EXTRA, diversas vezes, mas não respondeu a nenhuma das solicitações.
A dificuldade de obter remédios no Rio leva pacientes a
buscarem doações em outros estados. É o que fez Hanna Araujo, de 27 anos,
moradora de Vista Alegre, na Zona Norte.
— Tive de recorrer a pessoas de São Paulo e Belo Horizonte.
O médico vai trocando o medicamento de acordo com o tratamento e também pela
dificuldade das pessoas de encontrar — afirmou a jovem, portadora da doença de
Crohn, inflação crônica do aparelho digestivo.
Hanna, que também utilizava o Mesalazina, vai passar a usar
o Adalimumabe este mês. Cada dose, que é injetável, custa R$ 5 mil, e ela
precisa tomar quatro por mês. Para sua surpresa e alívio, ela encontrou o
remédio disponível na Rio Farmes.
Também com retocolite ulcerativa, Thayane Claudino Alves,
de 32 anos, moradora do Estácio, faz uso do Azatioprina. Ela teve notícia de
que o abastecimento foi regularizado na Rio Farmes, mas desde o fim de 2016 não
conseguia retirálo. Com isso, recorria a doações vindas de locais distantes
como São Paulo e Santa Catarina. Hoje, ela integra a Associação de Pessoas com
Doenças Inflamatórias Intestinais criada, entre outras coisas, para ajudar a
facilitar o acesso dos pacientes aos medicamentos. O custo é apenas o do frete.
Nelson Nahon, presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj),
defende que a prescrição de medimentos é atribuição dos médicos e que a
distribuição cabe ao SUS. Para ele, o recurso utilizado por esses pacientes mostra
a dificuldade do estado em cumprir sua parte. Nahon alerta para os riscos, como
o uso de medicamento vencido.