Aviso de Privacidade Esse site usa cookies para melhorar sua experiência de navegação. A ferramenta Google Analytics é utilizada para coletar informações estatísticas sobre visitantes, e pode compartilhar estas informações com terceiros. Ao continuar a utilizar nosso website, você concorda com nossa política de uso e privacidade. Estou de Acordo

Clipping - Faltam materiais de proteção em alas de infectados, dizem servidores de SP

Folha de São Paulo /

24/03/2020


Secretarias de Saúde da capital e do estado negam escassez e dizem que há equipamento para todos

"Queremos EPIs, queremos EPIs, queremos EPIs”, gritavam funcionários em um dos corredores do Hospital Municipal do Tatuapé, na zona leste de São Paulo.

Cenas como essa têm se repetido em hospitais e unidades de saúde no estado de São Paulo. Funcionários relatam falta de equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados até para os profissionais que têm contato direto com possíveis casos de coronavírus, relatam servidores.

No Hospital do Tatuapé, por exemplo, há cerca de dez funcionários que contraíram Covid-19, segundo o sindicato da categoria. O clima de medo e a situação de risco levaram profissionais a ameaçar abandonar seus postos.

Segundo um protocolo do Ministério da Saúde, os profissionais responsáveis por atender possíveis casos ou infectados deveriam ter gorro, óculos de proteção ou protetor facial, máscara, avental impermeável de mangas longas e luvas de procedimento.

Preparando-se para a escassez dos equipamentos no mercado, a gestão Bruno Covas (PSDB) cogita até confiscar esse tipo de material.

A administração afirma que quem precisa dos equipamentos os têm à disposição. No entanto, a Folha conversou com médicos de UTI e do Samu que dizem receber equipamento inadequado em hospitais da prefeitura.

“Não estamos usando o EPI adequado. Não há gorro e os aventais não são impermeáveis, como deveriam ser”, diz um médico do Samu sob a condição de anonimato.

O médico relata falta de preparo das equipes também. "A falta de treinamento faz com que os funcionários se sintam inseguros, façam aso inadequado dos materiais e comecem a fazer estoques próprios.”

No Hospital do Servidor Público Municipal, funcionários relataram que o isolamento entre pacientes com e sem infecção do coronavírus foi feito com cortinas plásticas improvisadas. Ali, segundo eles, o avental é descartável, e não impermeável, e é disponibilizada apenas uma máscara por semana.

O Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo) afirma que o problema é generalizado. A prefeitura diz que o equipamento não é para todos, mas o sindicato discorda.

"Há o EPI básico, que todo profissional da saúde deveria ter, que é viseira, máscara e avental. Há aqueles que vão para as alas dos infectados, que precisam também de mascara N95, gorro e macacão impermeável”, disse o vice-presidente do órgão, João Gabriel. Segundo ele, sem máscaras e testes os servidores podem transmitir corona-vírus a outros pacientes. O órgão de classe disse ainda que há um relato de que a direção de um hospital da capital recomendou que os funcionários não usassem máscaras para não assustar os pacientes.

A reportagem também recebeu relatos de falta de equipamentos em unidades de referência, como o Hospital das Clínicas da USP e o Hospital São Paulo, da Unifesp.

O secretário municipal da Saúde, Edson Aparecido, disse que não falta equipamento para os funcionários que precisam. "Não é para todo mundo, é para urgência e emergência", disse. "Se todo mundo seguir a regra, hoje tem uma carreta inteira de máscara”.

Aparecido diz que o decreto sobre coronavírus na cidade permite o recolhimento administrativo de material, se necessário. A prefeitura afirmou que, diante da escassez mundial de EPIs, comprou 5 milhões de máscaras cirúrgicas e 1 milhão de máscaras N95.

Segundo a administração, os funcionários estão recebendo kits específicos de acordo com os setores onde trabalham.

O Hospital das Clínicas da USP afirmou que, desde janeiro, instituiu um comitê de crise para acompanhar e prevenir todas as necessidades decorrentes da epidemia provo -cada pelo novo coronavírus.

“O hospital possui todos os insumos, incluindo álcool em gel, máscaras e luvas para os profissionais. Adotou todos os protocolos para garantir a segurança de profissionais e pacientes, incluindo o aso de máscaras, que não estão em falta para os casos necessários”, diz o hospital.

O HC, no entanto, alerta que o uso indiscriminado de máscara e outros insumos por parte de quem não tem indicação de uso pode, sim, provocar a falta do material para os profissionais de saúde.

O Hospital das Clínicas de São Paulo anunciou nesta segunda que será transformado, a partir desta terça (24), no maior centro para tratamento de pacientes infectados com a Covid-19 do país. Serão destinados 900 leitos exclusivamente ao tratamento da doença, sendo 200 deles de UTI.

A ação faz parte de um acordo entre o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), a Secretaria de Estado da Saúde e o Centro de Contingência do Coronavírus.

De acordo com o governo, todos os pacientes com outras doenças internados no complexo serão transferidos para um dos outros sete institutos ligados ao HC. Até sexta-feira (27), serão liberados os 200 leitos de UTI.

O encaminhamento dos pacientes para o HC será feito pelo centro de regulação da Secretaria da Saúde. Serão atendidos casos moderados e graves. Isso significa que o Hospital das Clínicas não atenderá pacientes que procurarem diretamente o complexo.

Pessoas com necessidade de atendimento devem procurar diretamente as unidades básicas de saúde, que farão o encaminhamento.

Já o Hospital São Paulo afirmou que possui os equipamentos de proteção e a indicação de qual tipo de máscara, óculos e aventais devem ser usados de acordo com o tipo de contato. Em nota, a instituição afirma que, diante de risco de contágio, as pessoas querem a melhor proteção possível, ainda que haja uma indicação de uso para cada um dos equipamentos.

No Rio, falta atinge até hospital de referência

A falta de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), indispensáveis diante da disseminação do novo coronavírus, para profissionais de saúde atinge largamente os hospitais no Rio de Janeiro, segundo relatos de médicos e enfermeiros.

O problema ocorre até no hospital federal de Bonsucesso, anunciado na semana passada pelo Ministério da Saúde como referência no tratamento dos pacientes coma doença.

Profissionais que trabalham no hospital disseram à reportagem que não há máscaras cirúrgicas ou do tipo N95 nem aventais, luvas e gorros suficientes para os funcionários. O uso de todos esses equipamentos está indicado no protocolo de manejo clínico para o vírus, produzido pelo próprio Ministério da Saúde.

O médico Júlio Noronha, diretor do Corpo Clínico, parou de ir ao hospital depois de apresentar tosse seca e dor de garganta, no corpo e de cabeça. A unidade já atendeu pacientes com sintomas semelhantes aos do coronavírus.

"Peguei uma gripe, e como sou grupo de risco, acima de 65 anos, e não estamos tendo facilidade para testar, se recomendou que eu ficasse afastado. Muitos funcionários estão gripados no hospital de Bonsucesso, tanto médicos quanto de outras categorias”, diz.

O departamento da saúde do trabalhador está tentando garantir kits de testagem para os profissionais que apresentaram sintomas do vírus. Caso isso não aconteça, Noronha terá que procurar uma unidade particular.

Na segunda (16), o Ministério da Saúde anunciou o que o hospital será referência no tratamento da doença. Um dos blocos começou a ser adaptado para atender pacientes que precisarão de internação. Serão reservados de 150 a 200 leitos.

Marco Schiavo, diretor do Sindicato de Enfermeiros e funcionário no hospital de Bonsucesso, afirma que o anúncio aconteceu antes do planejamento e treinamento com os profissionais do hospital.

Segundo Schiavo, a direção afirma que há equipamentos de proteção disponíveis. Na prática, no entanto, profissionais relatam que eles estão em falta em diversos setores. O enfermeiro confirma que há muitos funcionários com sintomas de gripe.

Há, ainda, relatos de falta de equipamentos de proteção no Hupe (Hospital Universitário Pedro Ernesto), da Uerj, no Hospital Getúlio Vargas e no Hospital Federal do Andaraí.

A reportagem também recebeu um vídeo de uma enfermeira do Hospital Federal Cardoso Fontes, Chris Gerardo, no qual reclama que não há máscaras para os profissionais.

“Hoje chegou uma paciente com todas as suspeitas de coronavírus e simplesmente temos poucas máscaras comuns. A colega de trabalho, com criança e idoso em casa, pediu a N95 ao supervisor e foi negado. A outra colega insistiu, porque é do grupo de risco, tem asma. Foi jogada a máscara para ela, como se fosse um favor”, diz na gravação.

Diante desse cenário, a Justiça Federal intimou no fim de semana o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e os secretários estadual e municipal de Saúde do Rio a prestarem informações sobre o atendimento aos infectados pelo novo coronavírus no estado.

Eles precisarão explicar, por exemplo, qual a previsão de compras de insumos para o hospital de Bonsucesso e de equipamentos de proteção individual para os profissionais da saúde. Também terão que responder qual a previsão de leitos e o cronograma de instalação nos hospitais.

A decisão ocorreu no contexto de ação civil pública movida pela Defensoria Pública da União contra o governo federal, o estado e o município.

O Sindicato dos Enfermeiros e o Sindicato dos Médicos do estado também entraram com ações judiciais contra os três entes para obrigar as unidades a disponibilizarem equipamentos de proteção na quantidade adequada.

O Cremerj (Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro) publicou uma resolução que desobriga os médicos de atenderem pacientes se não tiverem os equipamentos necessários.

O médico Flávio de Sá, diretor do conselho, ressalta que desproteger o profissional de saúde é permitir que ele se torne um vetor da doença. “Cada pessoa contaminada tem o potencial de contaminar mais quatro. Na Europa, 20% dos pacientes são médicos”, diz.

Em nota, a Secretaria de Estado de Saúde afirmou que providenciou a compra de equipamentos de proteção para atender pacientes em estado grave e profissionais da saúde.

Segundo o texto, foram adquiridos 1,5 milhão de máscaras cirúrgicas, 150 mil máscaras de proteção, 300 mil óculos, 600 mil aventais, além de gorros cirúrgicos e luvas. As entregas serão feitas pelos fornecedores, seguindo solicitação da secretaria.

Também em nota, o Hospital Federal de Bonsucesso afirmou que não há falta de equipamentos de proteção e que o estoque está sendo reforçado para enfrentar a pandemia.

“O HFB adotou todos os protocolos do Ministério da Saúde e da Organização Mundia 1 de Saúde (OMS) para o atendimento dos casos de coronavírus na unidade, o que preconiza a adoção de máscaras apenas para pacientes com sintomas ou infectados [...] e profissionais de saúde que fazem atendimento a esses pacientes”, diz o texto.

Procurado, o Ministério da Saúde respondeu que tem trabalhado para garantir insumos com fornecedores nacionais e internacionais, a partir de compra emergencial, para reforçar o apoio aos estados e municípios no enfrentamento do vírus.

A pasta disse que irá entregar 60 milhões de unidades entre óculos de proteção, luvas, álcool em gel, sapatilhas e toucas. O ministério também afirmou que assinou contrato de R$ 73 milhões para a compra de máscaras.

Brasil tem 34 mortos por coronavírus e 1.891 casos confirmados

O Brasil chegou nesta segunda (23) a 34 mortos e 1891 casos confirmados do novo coronavírus, segundo o Ministério da Saúde. Até o domingo (22) eram 25 mortos e 1.546 casos. Das 34 mortes, 30 ocorreram em São Paulo e 4 no Rio de Janeiro; 22 são de homens e 12 de mulheres. Pelo menos oito deles tinham confirmação de doenças associadas, como diabetes e hipertensão. No caso das mortes apenas de mulheres, a média de idade é de 80 anos. Entre os homens, 73 anos. Considerando homens e mulheres, a média é de quase 76 anos. A pessoa mais velha a morrer no Brasil por causa do coronavírus foi uma mulher de 96 anos, em São Paulo.