Clipping - As técnicas que vêm mudando os tratamentos
O Globo / Especial
04/02/2019
Medicamentos para o sistema imunológico já dão resultado, enquanto terapia genética é nova aposta
‘Se você tomar esse remédio, você vai morrer’. Foi essa
frase que Yago de Lima ouviu de um médico sobre uma nova droga receitada por
outro profissional. A situação do jovem era delicada. Após uma tosse constante
e emagrecimento, descobriu que estava com um linfoma de Hodgkin em estágio
avançado. Passou por seis meses de quimioterapia, sem sucesso. Um transplante
de células-tronco foi feito com sessões de quimioterapia sem interrupções, 24
horas por dia, por uma semana. Após três meses, a doença sumiu. Seis meses
depois, voltou. A equipe hospitalar do Instituto Nacional de Câncer (Inca), que
tratava Yago, disse ter esgotado todos os recursos possíveis.
Uma médica da instituição indicou um outro profissional,
particular, o oncologista Daniel Tabak (leia entrevista com o médico na página
4), que prescreveu uma nova droga a Yago. Ele teve reações inesperadas que o
levaram ao coma. Foi nesse momento, sendo tratado pela reação do primeiro
medicamento, que o jovem escutou a frase de um outro médico sacramentando seu
destino. Ainda assim, Yago voltou ao doutor Tabak, que lhe apresentou uma outra
nova droga, que não existia no Brasil e nem mesmo o oncologista sabia como
conseguir.
— Pedimos a medicação na Justiça, mas eu não podia esperar.
A gente entrou em contato com fornecedores, e minha família se uniu para quatro
doses. Cada uma custava R$ 25 mil. A aplicação deveria ser de 15 em 15 dias,
mas não podíamos pagar. Fiz uma aplicação em um mês e a outra só depois de 40
dias. O médico me explicou que a droga era imunoterápica. Ao invés de
enfraquecer a célula cancerígena, ela fortalece o seu sistema. Um mês após o
tratamento, o exame que fiz mostrou que estava limpo — lembra Yago, hoje com 23
anos.
A busca por um novo medicamento para Yago foi feita em
2016. No ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
autorizou uma série de drogas imunoterápicas, que estimulam o sistema
imunológico, incluindo o que ele usou. É um passo para uma maior diversidade de
instrumentos no combate ao câncer.
NANOTECNOLOGIA
Outras áreas tecnológicas também estão somando esforços em
pesquisa. No Instituto de Química da Unicamp, o professor Oswaldo Luiz Alves
trabalha com nanotecnologia para a melhora do tratamento.
— Isso faz parte das abordagens usadas para tratar o
câncer, nas quais poderíamos chegar até os tumores e só então liberar os princípios
ativos dos fármacos, com a expectativa de um aumento da eficácia do tratamento
quimioterápico — aponta o professor, que reafirma a importância da pluralidade
de iniciativas. — Efetivamente várias terapias estão sendo estudadas para o
combate dos diferentes tipos de câncer. Muitas estão
próximas de se tornar parte do arsenal disponível e poderão mostrar sua
eficácia para bons diagnósticos.
Outra aposta da medicina é a terapia genética. Uma delas,
que foi aprovada no ano passado pelos Estados Unidos, é a Car-T.
—Essa tecnologia tem sido considerada uma mudança de
paradigma no tratamento de pacientes oncológicos, uma vez que obteve resultados
excelentes nos testes clínicos. Pacientes que haviam tido recidiva da doença
após quimioterapia e transplante de medula têm mostrado remissão —
afirmaPatriciaRozenchan,diretora da startup Celluris,
incubada no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia da Universidade
de São Paulo (USP), e que realiza pesquisa para desenvolver essa tecnologia no
Brasil.
Nesta modalidade, as células do sistema imunológico do
paciente, no caso o linfócito T, são usadas para combater o tumor. Elas são
retiradas numa coleta de sangue e modificadas em laboratório para ativar uma
molécula chamada receptor, que reconhecerá um marcador específico na célula
tumoral. Dessa maneira, o linfócito consegue detectar a célula tumoral e gerar
um ataque preciso contra ela. Uma vez modificadas,
essas células T, agora chamadas de Car-T, são multiplicadas
em laboratório e depois recolocadas no paciente para destruir as células
tumorais, explica a especialista.
O hospital Albert Einstein, em São Paulo, está investindo
em espaços para trabalhar com três frentes de terapia celular. Uma delas é o
Car-T.
— A terapia celular é mais uma arma. Alguns casos não vão
responder a determinados tratamentos. Por isso, precisamos cada vez mais
personalizar os métodos. Além disso, a quimioterapia é o menos específico
possível: ela mata a célula a boa e a célula má —aponta Gustavo Schvartsman,
oncologista do hospital.
“Existem várias terapias sendo estudadas para o combate ao
_ câncer” Oswaldo Alves, pesquisador da Unicamp
“Precisamos cada vez mais personalizar _ os métodos”
Gustavo Schvartsman, oncologista do Albert Einstein