Clipping - O silêncio dos candidatos
O Globo / Opinião
01/05/2018
Sem propostas objetivas para resolver a crise na Saúde, candidatos se expõem às consequências de um ‘estelionato’ eleitoral. O ronco das ruas de 2013 ainda ecoa alto e claro
Faltam apenas 20 semanas para as eleições gerais. E os 146
milhões de eleitores continuam na absoluta escuridão, sem ideia de qual é o
Brasil imaginado por candidatos e partidos. Tem-se 18 nomes listados nas
últimas sondagens de intenção de voto para a Presidência da República, mas, até
agora, nenhum deles sequer demonstrou preocupação em submeter ao eleitorado uma
proposta alternativa para a crise do Sistema Único de Saúde (SUS), do qual
dependem diretamente 150 milhões de pessoas.
Mantêm silêncio, da mesma forma, sobre suas ideias para
acabar com a irracionalidade dominante nas relações entre os 50 milhões de
brasileiros que não dependem do SUS, porque têm acesso a planos de saúde, e as
mais de 800 empresas operadoras médico-hospitalares. Na crise da Saúde, não há
rota de fuga disponível a candidatos e partidos. Eles sabem que a situação do
sistema é insustentável e, por isso, precisam dizer logo aos eleitores como pretendem
resgatá-lo ou liquidá-lo — nesse caso, explicando o que planejam pôr no lugar.
O SUS é uma obra de arte política. Nasceu há exatos 30
anos, em circunstâncias de rara unanimidade parlamentar, em torno da ideia de
saúde gratuita para todos. Os resultados estão visíveis no acesso irrestrito à
rede pública de hospitais, no aumento da expectativa na prevenção de vida, na
(vacinações), redução da nos mortalidade transplantes infantil, de órgãos e no
tratamento de infecções pelo HIV.
Suas deficiências são indicadas como principal problema
nacional desde junho de 2013, quando centenas de milhares de pessoas saíram às
ruas, em todo o país, em protesto contra a inépcia nos serviços públicos
básicos. Detalhe relevante nessas pesquisas é a boa avaliação do SUS pela massa
que dele depende, quando consegue atendimento. Na origem da crise da Saúde está
a apropriação privada de fatias do Orçamento público. União, estados e
municípios investem R$ 230 bilhões por ano, o equivalente a 3,7% do Produto
Interno Bruto, metade da média dos gastos registrados em sociedades ricas.
Seria irracional propor tão somente um aumento de despesas numa etapa de
virtual falência governamental. Mas a saída, certamente, começa pela
higienização do poder político sobre os contratos. A degradação acelerada nos
serviços é consequência do predomínio de interesses particulares, da regulação
até a fila de pagamentos às empresas.
Os governos Lula, Dilma e Temer usaram a saúde coletiva
como moeda no Congresso. Permitiram a expansão do loteamento partidário em
áreas-chave do Ministério da Saúde, da Funasa e da agência setorial ANS. Os
principais beneficiários (PT, PMDB e PP) estenderam sua influência aos estados
e municípios.
É eloquente que um partido como o PP do senador Ciro
Nogueira — recordista em investigados na Operação Lava-Jato (41% da atual
bancada) —, comande o ministério e a ANS. Ou ainda, que o líder do governo,
deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), tenha recebido de presente a nomeação da
mãe no comando da Funasa na Paraíba, 24 horas depois de ter sido denunciado ao
Supremo por corrupção.
Sem propostas objetivas para resolver a crise na Saúde,
candidatos e partidos se expõem às consequências de um “estelionato” eleitoral.
O ronco das ruas de 2013 ecoa alto e claro, cinco anos depois.