Clipping - Por causa da crise, Pedro Ernesto reduz atendimento
O Globo /
20/06/2017
Diretor diminui leitos de 350 para 100 e cirurgias, de 2 mil para 300 por mês
A crise que assola o Estado vai, mais uma vez, prejudicar o atendimento no Hospital estadual Pedro Ernesto. Por conta do atraso de dois meses no pagamento a professores, servidores, residentes e bolsistas — muitos não têm sequer dinheiro para pagar transporte até o trabalho — a direção da unidade resolveu restringir o funcionamento. O diretor do hospital, Edmar Santos, informou que reduziu, a partir de ontem, o número de leitos de 350 para 100. Os atendimentos ambulatoriais tiveram um redução drástica —de 150 mil por mês para 60 mil. As cirurgias, que antes chegavam a 2 mil por mês, não devem passar de 300. Os procedimentos para mudança de sexo — o Pedro Ernesto é único do Rio e um dos cinco do Brasil que realizam a operação — também podem ser afetados.
— É uma situação caótica. O corpo técnico não entrou em
greve. Está todo mundo vindo trabalhar em respeito à população. Mas já chegou a
um ponto em que há pessoas que nem têm dinheiro de passagem para vir. Outras,
não têm para comer — lamentou Santos, acrescentando que os recursos para o
pagamento de seguranças, do serviço de limpeza e de remédios estão em dia
graças a arrestos nas contas do governo do estado feitos pela Defensoria
Pública.
Ontem de manhã, funcionários e bolsistas do hospital
fizeram um protesto diante da unidade. Com cartazes e narizes de palhaço, os
manifestantes gritavam frases como “Pezão caloteiro, cadê o meu dinheiro?” e
empunhavam cartazes com dizeres como “Queremos condições dignas de
trabalho", “Como trabalhar se não tem o que comer?”.
Os manifestantes ocuparam o Boulevard Vinte e Oito de
Setembro e, apesar da confusão no trânsito, receberam buzinadas de apoio de
motoristas que passavam pelo local.
— Estou há 44 anos no Pedro Ernesto. Estudei aqui e hoje
sou professora de dermatologia. Nunca vi uma situação semelhante. Os
governantes não sabem que, no fim da linha, falta remédio e uma pessoa morre.
Onde está o dinheiro da corrupção, que poderia estar pagando os profissionais?
— indagou Luna Azulay, de 68 anos.
Entre os bolsistas, que
deveriam receber auxílio mensal de R$ 3.300, as queixas são muitas. Rodrigo
Savin, coordenador da residência em enfermagem, setor que tem 131 bolsistas,
diz que, ele mesmo, não tem mais como trabalhar.
— Minha mãe têm câncer e está muito debilitada. Preciso
cuidar dela e da minha residência para que eu possa ter uma boa formação. Moro
em São Cristóvão e, se o atraso se estender por mais uma semana, não terei mais
dinheiro para pagar passagem. Não poderei mais vir.
Alunos de outros estados estão em situação ainda mais
grave. Graduada em Nutrição, Ive Dias, saiu há quatro meses de Vitória da
Conquista, na Bahia, em busca de especialização em saúde do idoso no hospital.
Já pensa em arrumar as malas e ir embora.
— Tenho duas opções. Suportar pedindo dinheiro emprestado
ou voltar para a minha terra com muita decepção na bagagem. Dos quatro meses
que estou aqui, só recebi uma bolsa. Entrei em março, recebi em abril. Faltam
maio e junho. Moro com duas colegas num apartamento em Vila Isabel. Cada uma
paga R$ 700 de aluguel. Preciso gastar com alimentação, transporte. Já não
tenho mais dinheiro.
As perspectivas não são boas. Na manhã de ontem, o diretor
do hospital esteve reunido com cerca de 200 residentes e não levou boas
notícias: ele foi claro em dizer que não há luz no fim do túnel, ou seja, não
há garantias de quando os residentes terão suas bolsas normalizadas.
PACIENTE TEME FUTURO
Enquanto isso, os pacientes temem que o atendimento seja
ainda mais prejudicado. Com deficiência de plaquetas no sangue, que a obriga a
ficar acamada o tempo todo e a se submeter a diversas cirurgias, Eliana
Ponciano Justino de Sousa, de 37 anos, teme o futuro. Ela já fez 45 cirurgias e
pode precisar de mais uma.